sábado, 30 de abril de 2011

As guias dos orixás

Sabia que seria o centro das atenções. Mas o que fazer se tinha mesmo de ir àquela festa? Era o aniversário de uma grande amiga de seu namorado, aliás, o primeiro de uma série dos quais participou.

Ela coitada! pobrezinha: uma universitária linda, mas pobre. Desde o dia em que soube que teria de ir a esta festa não deixou de preocupar-se. Como iria? Como se vestiria? Será que não passaria por ridícula?

O namorado queria lhe mostrar a todos, claro! Era a mesmo uma mulher linda, e estava no frescor da sua beleza completamente natural, sequer se pintava. As suas roupas eram despojadas, não seguia moda porque não havia possibilidade de fazê-lo. Nesse tempo usava calças pijamas e o auge mesmo era a calça jeans, que, na sua grande maioria, e aliás para ter mesmo um grande valor, tinha de ser uma contrabandeada. Ela tinha uma, presente de um dos seus admiradores.

Bom, mas a calça jeans destoava da ocasião, pelo menos ela pensava assim; teria mesmo de arrumar uma maneira de ir a essa festa. Pensou em tomar uma roupa emprestada, mas não fez, porque o namorado parece ter entendido a sua ansiedade e lhe presenteou com uma saia lindíssima, do estilo que ela gostava. Estilo! Como se pobre tivesse direito à estilo, mas na verdade ela tinha mesmo um: era meio “Hippie”, gostava das roupas menos convencionais, “batas”, “calças estilo pijama”, “sandália de couro”, “roupas largas e compridas”, apesar de vestir muitos vestidos curtos que lhe valeram o apelido de “belas pernas” e de “bailarina das pernas grossas”. O fato é que seja de longo, seja de curto, seja de calça, sempre, mas sempre mesmo, chamou atenção.

Voltando às preocupações da festa. Ganhou a saia, e junto com ela uma sandália. A saia tinha nesgas. Era uma saia comprida com nesgas de um pano estampado e outras nesgas “jeans”, que se alternavam, era realmente linda.  A cintura meio baixa e a saia tinha muito movimento, porque do meio para o fim as nesgas cresciam e ela ficava bem rodada. A sandália acompanhava a saia; era também, de “jeans”, alta, com uma tirinha na frente, deixando a mostra todo o seu pé, que, sem falsa modéstia, sempre valorizou o calçado, porque muito bem feito. Bom, já estava mais de que vestida, mas faltava uma coisa: a blusa. Como arrumar uma blusa para usar com aquela saia? Já não podia falar com o namorado sobre isto, afinal ele já lhe presenteara com a saia e a sandália, seria, pois, uma grande sacanagem falar da blusa.

Teve uma idéia. Tinha em casa calças jeans antigas, velhas, desbotadas e entrou em ação, isto já na manhã da festa. A mãe costurava e ela pensou que ela poderia fazer a blusa.

Cortou as calças na altura da coxa, mediu o seu corpo na altura dos seios e pensou: Faço um "bustiê", deve ser assim que escreve, ou seja; uma tira de pano para cobrir os seios e já está. E foi o que fez. Cortou a tira, pediu à mãe que fizesse uma emenda no pano, dado que a largura não deu por inteiro, e que fixasse alguns colchetes no fundo. O que foi feito. Vestiu tudo, olhou-se no espelho, mas não gostou do resultado. A tira de pano parecia amassar seus peitos, não tinha movimento, ficou muito sem graça.

A hora da festa se aproximava e não se tinha solução para a blusa. De repente ela viu as contas de “santo” da sua mãe: colares de pedrinhas coloridas, muitos deles. Sem pestanejar pensou: E se eu colocasse estes colares como um suporte para esta blusa? Faria um nó na parte que ficava entre os seios e puxaria as contas até o pescoço, como se elas fossem mesmo um colar. Implorou á mãe que a deixasse fazer isto. A mãe não queria, porque as “contas” eram mesmo das suas obrigações com os santos, foram “lavadas”, “bentas”, enfim, tinham participado de todo o contexto da sua própria história, demonstravam quais os guias daquele “cavalo”(pessoa em que os orixás se manifestam), que era a sua mãe: “oxum", "omolú", "Iansã" "Nanã", e tantas outras, um belo colorido: amarelo ouro, azul turquesa, branco, verde. Depois de muito insistir a mãe cedeu, e ela colocou as contas como idealizara. O efeito foi maravilhoso. As contas fizeram a divisão dos seios e realmente salientaram a silhueta.

Quando o namorado chegou para pegá-la ficou entusiasmado. Ela estava simplesmente linda, a simplicidade da roupa, a excentricidade simples das contas, a sua própria beleza estava acentuada pela roupa, que lhe deixava à mostra a cintura delineada, o umbigo, o colo valorizado pelo desenho feito pelas contas. O cabelo encaracolado que lhe valera o apelido na faculdade “cabelo de ovelha”, completava o quadro.

Saiu de casa sabendo que estava realmente linda, mas, ainda assim, não sabia muito bem como se comportar em uma casa, para ela, “de ricos”. Afinal o dono da casa era um catedrático da faculdade. A filha aniversariante era colega de faculdade do namorado. O noivo dela, também era universitário, ambos estavam acabando o curso de direito. Moravam numa casa "chic" em um bairro "chic". A casa era freqüentada por empresários, artistas, professores, enfim, era um mundo completamente diverso do seu. O namorado lhe dava força, afinal ele queria mesmo é que todos conhecessem a sua nova aquisição.

E foi assim que ela entrou, pela primeira vez, naquela casa, que seria, durante longos anos da sua vida, um ancoradouro. Triunfante, viu os olhares sobre ela, tanto de homens quanto de mulheres. O seu namorado em nenhum instante desgrudou dela, parecia saber bem onde estava e com quem lhe dava. Os colegas de faculdade que ali estavam lhe diziam da sua beleza; estavam encantados, até porque nunca lhe viram tão arrumada assim. O dono da casa não lhe poupou os elogios, aliás, que se prolongaram até o resto da sua vida, ele era mesmo um admirador do belo, e ela estava incluída neste conceito, sempre lhe falava dos seus traços “gregos”. Ela ficava entre o envergonhada e o lisonjeada, tamanha a ênfase do admirador.

Nesse dia, conheceu muitas pessoas que seriam muito importantes e, em alguns momentos, fundamentais na sua vida.

Seguiu sua vida no meio daqueles que conheceu naquele dia de setembro do ano de 1973. Sabe que com o seu jeito simples conquistou muitos deles, que ainda hoje seguem os seus passos e continuam a se surpreender consigo, porque ela conseguiu mostrar que não era só bela, e sim uma grande e forte  mulher, capaz de driblar todas as adversidades, inclusive aquelas causadas por quem lhe apresentou àquela casa de sonhos e realizações.

As guias dos orixás da sua mãe, certamente, tiveram um papel fundamental em tudo isto: seguraram o seu peito e protegeram-na dos “maus olhados”. Eparrê! Atotô babá! 



sexta-feira, 22 de abril de 2011

MACACO NÃO OLHA PARA O RABO

Quando estive em Maputo – Moçambique, fiz muitos comentários a respeito da sujeira da cidade, da pobreza, do tóxico, da prostituição das jovens, transportes públicos, dentre outras.

As críticas, infelizmente, falavam de coisas reais, do que vi, do que presenciei.

Voltei para Lisboa, e talvez por isso mesmo eu tenha achado que Maputo era tão suja, não que Lisboa, em alguns sítios, não o seja, mas por estar acostumada com o sistema de coleta de lixo da cidade, principalmente onde vivo, em Carnaxide, em que não se vê acúmulo de lixo, embora, como em todo Portugal, os dejetos do “melhor amigo do homem” insistam em sujar toda o país. É que em Lisboa os donos de cães utilizam a rua como sanitário publico para os seus bichos de estimação, sem o menor respeito pelo cidadão, que a qualquer momento pode escorregar na “merda”, cair, ficar machucado, simplesmente pelo fato de que os educados proprietários de cachorros, acham normalíssimo o fato de levar os seus cães para fazerem as necessidades na rua, exercendo, assim, o direito de “cidadania” dos pobres animais.

Acho mesmo interessante conversar em Lisboa com os proprietários de cães, que levam os seus animais para fazerem as necessidades na rua; eles acham que tem direito a isto e que não incomodam ninguém pois fazem isto altas horas da noite, certamente para encobrir a sujeira e achando que assim, estão preservando os demais. Alguém chegou a me dizer, quando argumentei que os animais sujavam tudo, calçadas, jardins, grama, etc. que o cachorro dela era educado, que ela tinha o cuidado de levar o bicho num cantinho. É inacreditável, o português cobra tudo, tudo mesmo, faz criticas a tudo, se aborrecem por tudo, gritam uns com os outros, mas quando se trata de “animais” tudo é permitido. Imagine que eles se permitem levar os bichos para restaurantes e você tem de ficar comendo e espreitando o animal na mesa ao lado. Quem não esta acostumado com o bicho, quem não conhece o animal fica temeroso do que ele possa fazer e não adianta o dono dizer que ele é manso, que não faz nada. A questão é mesmo de educação, mas parece que em Portugal não se liga muito para isto. O hábito de levar os animais para sujar a rua está mesmo enraizado na população.

Pois é, não concordo com isto e acho mesmo uma grande falta de cidadania e de respeito para com o próximo, mui principalmente aquele que não tem animal e que é obrigado a andar com toda atenção na rua para não escorregar nos dejetos que decoram as pedras portuguesas, os jardins, as esplanadas.

Também falei de Lisboa com relação às drogas no Martim Muniz, Intendente, e adjacências e à mendicância, que no centro realmente é estarrecedor, pois os mendigos fazem casas de papelão nas portas dos grandes monumentos da cidade, a exemplo do teatro Dona Maria, das arcadas da Praça do Comércio, escadarias da estação de comboio do Rossio, no Martin Moniz, dentre outros lugares.

De Lisboa voltei para o Brasil, para minha querida Salvador. Que tristeza. Nunca vi a cidade em tamanha degradação. O lixo tomou conta dela. Na Conceição da Praia é até nojento andar nas ruas sujas. A frente do Elevador Lacerda, cartão postal da cidade, é uma desolação. O cheiro de urina entra pelas narinas lhe revoltando o estomago. Não se pode passar nas calçadas tomadas de ambulantes, disputa-se lugares entre eles para não ser atropelado pelos automóveis quando se anda no meio da rua. Lixo por todos os lados, pessoas feias, mal encaradas, prostituas, desordeiros, bêbados, uma coletividade inútil complementando a sujeira do local. Lágrimas me vieram aos olhos, mas não foi só na Conceição da Praia que isto aconteceu. A cidade alta também esta na mesma degradação. Subi o Elevador e, apesar de chorar de emoção ao olhar a Bahia de Todos os Santos, chorei de raiva ao passar pela Rua Chile em direção a Carlos Gomes. Tudo feio e sujo. Uma grande decepção mesmo, e eu me lembrei de Maputo, e tenho de me penitenciar.

Salvador não está só suja, acabaram com ela, com um dos seus grandes atrativos que eram as barracas de praia. A impressão que tive foi que um grande tsunami ocorreu na orla de Salvador. O governo local retirou todas as barracas da praia, alegando questões ambientais e da construção ilegal na área. Engraçado é que estas barracas estavam nos seus lugares há muito tempo, e a lei sempre existiu, mas nunca ninguém tomou providência. Permitiram que os “barraqueiros” ali ficassem, fizessem o seu meio de vida, para, num belo dia, em que alguém amanheceu de “ovo virado”, mandar destruir tudo. Foi destruição mesmo. Agora não temos mais barracas de praia com banheiro, água, chuveiro, cozinha decente, mas se permite que comidas sejam feitas na praia, barracas sejam armadas, xixi seja feito na areia, enfim agora é que se está politicamente correto, e que os cidadãos estão exercendo os seus direitos “ambientais”. Até seria louvável a iniciativa se realmente fosse esta a questão, mas não é, tanto que agora, já se pode construir arranha céus na orla. Será que estas construções que já estão em andamento e as que estão por autorizar não são contrarias às normas ambientais? Será que a retirada destas barracas não é uma maneira de preservar, dar segurança àqueles “classe alta” que vão ter condições de comprarem os imóveis de luxo que estão a ser construídos? Será que isto não é mesmo um favorecimento aos grandes empreendedores?

Como se isto não bastasse, estou andando de ônibus em Salvador. Terrível. Os ônibus sem qualquer conforto, sujeira dentro e fora dos ônibus, falta de cumprimento de horário, veículos sem quaisquer condições de trafegar. Os terminais depredados. A Estação da Lapa não tem condição de uso. Na verdade senti mesmo foi medo de estar ali.

Em São Cristovão não aconselho ninguém a tomar um coletivo. Aquilo deve ser coisa do Diabo, ou então estou pagando algum pecado que cometi, mas o pecado deve ter sido tenebroso, porque aquilo é mesmo uma provação. Fico imaginando o sofrimento dos trabalhadores que não tem escapatória, que não podem, como eu, tomar um taxi, sair dali e pegar um ônibus em outro local. Os ônibus não param no ponto porque os transportes alternativos “vans”, se fosse em Moçambique eram “chapas”, não permitem que eles se aproximem; resultado, temos que correr para o meio da rua para conseguir entrar neles. Um verdadeiro inferno. Além disto, os ambulantes estão por toda a parte tomando quase todo o passeio; os pobres coitados que vão tomar o coletivo ficam com uma nesga de passeio para aguardar a hora de se arriscar correndo para entrar no veículo e depois, aguardar uma outra forma de sucumbir: ser espremido dentro do próprio coletivo. É um verdadeiro horror, mas parece que isto não preocupa ninguém. O Sr prefeito de Salvador tá pouco se incomodando,agora está preocupado com as contas que o Tribunal de Contas do Municipio analisa.

Depois de tanta decepção, e já disposta a pedir desculpas a Maputo, fiz uma viagem para São Paulo.

São Paulo, para quem não sabe, é a capital financeira do país, não só financeira, mas o símbolo da nossa modernidade, da nossa cultura como um todo. Tudo acontece em São Paulo. Já há muito que não vinha até aqui. Ela me surpreendeu em muitos aspectos. Primeiramente fiquei orgulhosa de ver a modernidade. São Paulo tem metrô, tem sistema ferroviário - metropolitano, coletivos. Fiquei extasiada com as estações terminais, com as ligações, o transbordo, as conexões. Neste aspecto, se não fosse tanta gente a utilizar o sistema e ele já esta a precisar de expansão, a cidade não deve nada a nenhum centro europeu.

Andei na Paulista, fui a diversos shopping centers, fui aos Jardins, Alphaville, Ibirapuera, etc. Tudo maravilhoso. No entanto, no dia em que fui ao centro, que lástima! A Praça da República é um desalento, não recomendo ninguém a ir visitá-la. Deixe a República morrer, voltemos a Monarquia, talvez assim recuperemos a dignidade do local. A Praça em si está suja, porca. Marginais ocupam os seus espaços. A droga é cambiada em todos os lados, grupos de drogados se acomodam nos seus recantos. As carpas dos lagos já não se mostram porque a cor da água poluída sem limpeza não permitem que se exibam O lixo está espalhado em todos os lugares, as calçadas estão esburacadas. Quem vai até a praça se arrisca de todas as maneiras, pode perder a vida, como a bolsa e, por causa da bolsa, a própria vida.

A Avenida Ipiranga na altura da Praça da República está irreconhecível, sujeira por todos os lados.

Na Sé, outra decepção. Parece que agora temos um exército de desocupados ocupando os belos espaços de São Paulo, invadindo a história, mudando a história do nosso país. Fiquei triste, mais muito triste mesmo, mas, ainda assim, continuei a caminhada, queria ir ao Mercado Municipal, e efetivamente fui, até lá chegar mais sujeira, mais degradação, mais decepção.

Bem verdade que quando cheguei ao Mercado retomei a euforia de estar em São Paulo, pois aquele é um grande monumento. Volto a pensar em São Paulo como uma cidade bela, limpa, multicultural, uma grande metrópole, mas depois tenho de sair para voltar para casa, e aí, novamente, sujeira, pobreza, pânico.

Chego a casa sã e salva, a que custo. E aí me vem a certeza de que tenho de me desculpar para com Maputo, pois ela fica em Moçambique, África, que é, como se noticia, um continente pobre, subdesenvolvido, com uma quantidade imensa de analfabetos, doentes, subnutridos, embora dirigidos por grandes fortunas, que fazem parte de listas das mais ricos do mudo, embora, como as noticias demonstrem, as grandes ditaduras estejam caindo, o povo já não agjuenta mais.

Que direito tenho eu de falar de Maputo? Nenhum. Antes de falar de Maputo, preciso falar do meu próprio pais, da minha própria cidade, do lugar onde vivo. Maputo pode ter os problemas de que falei, pois esta incluindo num contexto de pobreza, de subdesenvolvimento, de analfabetismo, de doença, de fome. Mas como justificar tudo o que apontei no meu país em duas cidades completamente diversas – São Paulo e Salvador-? Uma representando o Sul e a outra o Nordeste, ambas com a mesma degradação, com a mesma sujeira, o mesmo descaso para com o patrimônio público. Depois, como justificar o que acontece em Lisboa, onde passo alguns meses por ano,em que encontramos todos os problemas aqui já referidos? Pois é: tenho de dobrar a língua quando falar de qualquer outro lugar agora, pois, como diria minha mãe:  "Macaco não olha para o rabo”!





segunda-feira, 18 de abril de 2011

Ogunhê

Estive em uma festa para Ogum; São Jorge para alguns e Santo Antonio para outros. Foi lá em Arembepe, no Coqueiro. Emocionei-me em demasia. Os tambores me faziam arrepiar, uma crescente emoção tomava conta do meu corpo, e, o que dificilmente acontece, eu estava ali de corpo e alma, pois não me lembro de ter pensando em qualquer outra coisa diversa do que ali acontecia.

domingo, 10 de abril de 2011

Os dois zeros positivos da direita

Esta é a postagem de número 100 no blog. Acho que deve ser comemorada. Comemora-se 1000 gols de Pelé, 1000 de Romário, 100 do goleiro Cene que, contrariando a sua posição em campo, faz gols, então eu também posso comemorar a centésima postagem. Acho até que com mais direito de que eles, porque todas estas pessoas são pagas para exercerem, e bem, a sua profissão, portanto o resultando não deveria ser objeto de qualquer comemoração; eu, ao contrário deles, comecei o blog por motivos outros, que não profissionais, e tenho o prazer de, menos de um ano depois da sua criação, ter sido visitada por 5.565 pessoas de países diversos. Imagine que tenho leitor na Croácia, certamente algum brasileiro aventureiro, porque não posso me dar ao desplante de achar que é um croata que lê as minhas postagens, evidente que não todas, porque se assim fosse a estatística mostraria, ao menos, 99 visitas, o que não aconteceu, ainda espero os Emirados, a China e o Japão, seria muita pretensão?

Bom, o certo é que esta é a centésima postagem. Não sei bem como começá-la, porque queria falar de uma porção de coisas, mas só vislumbro mesmo é o número cem. O número sugere muita coisa, primeiro tem muito zero, e zero, na grande maioria das vezes, não é uma coisa boa, a não ser que esteja sempre acompanhando um outro número, porque aí ele funciona como multiplicador; 10 pode virar 100, 1000, 100000, o infinito, reparem que ele sempre tem que estar à direita, porque se ele for para a esquerda, antecedendo o número, a coisa fica preta, embora os da direita possam aparecer em vermelho, o que é outra merda. Pensem que a inferioridade que ele traduz nesta posição é tamanha que a gente ouve a expressão: “Você é um zero a esquerda”. Zero á esquerda é forte mesmo! É botar alguém muito para baixo. É uma valoração mais de que negativa. Eu nunca ouvi esta expressão em relação a minha pessoa, ainda bem! Mas já ouvi alguém falar para uma pessoa a quem muito amo e fiquei mesmo indignada, embora, eu que nunca fui nenhuma santa, já tenha despejado esta mísera expressão, em alguém. Quem a ouviu de mim, por favor, me perdoe, sou humana e a gente fala com raiva, o bom é que, ao menos alguns que já ouviram isto partindo desta minha santa boca, que devia ficar fechada mais tempo, tenham passado o zero para a direita em suas vidas e ficaram positivados. Espero, ainda, que outros consigam, estou torcendo muito, a experiência, agora, já me permite pensar assim e torcer até para quem, ainda, merece que os zeros se multipliquem na esquerda. Se no racional quero os zeros à direita, no passional, ainda tenho estes pensamentos, que embora fugazes, ratificam os zeros da esquerda.

Bem, mas também não quero fazer apologia, seja positiva, ou negativa, nem de pessoas e nem dos zeros, sejam eles, “de esquerda”, ou de “direita”, embora ache que até os da “esquerda” adorariam ter os zeros “da direita”, principalmente nas contas bancárias.

O fato é que esta é a postagem número cem. Durante quase um ano as postagens foram feitas, - o blog foi criado em  abril pela Vera, que também é a criadora das primeiras fotos e foi quem, pacientemente, me ensinou o que sei fazer com o blog em termos de colocar as postagens, fotos, “gadgets”. Acho muito engraçado as palavras que são introduzidas no nosso vocabulário por esta tecnologia, mas enfim, tenho de me acostumar, caso contrário vai aparecer um zero a esquerda no meu curriculum; como não quero isto, acrescento zeros à direita na minha conta bancária sempre em negativo e cheinha de zeros: tem horas que até me desespero com este multiplicador de tudo, de erros e acertos. O meu balanço geral sempre dá negativo e os zeros positivando a negatividade.

Vejam bem que contraste, o zero positiva a negatividade. Que perfeição de raciocínio eu tive agora, não me sabia capaz de falar do zero com tanta filosofia, positivar a negatividade foi longe, acho que estou muito feliz por ter conseguido dizer que o zero é de uma importância fundamental para as pessoas, porque ele, efetivamente, é um fator, de alegria, de realização, de felicidade, porque ele consegue o negativo e positivo ao mesmo tempo, ele pode, tanto trazer a felicidade como ser o algoz da nossa infelicidade. Mesmo quando ele vem do lado direito do número, pode significar muita dor, muito desespero, como também pode significar vitoria, felicidade. No meu caso, do "mot" que me levou a escrever este texto, ele é um elemento de prazer, de felicidade, de alegria. Quando, entretanto, olho a minha conta bancária, ele me dá a terrível sensação de “derrota”, de imperícia, de culpa, não sei lhe dar com dinheiro e faço besteiras, embora algumas delas não me tragam arrependimento algum, mas outras me dão uma terrível dor de consciência, mas os sacaninhas dos zeros ficam lá bailando diante dos meus olhos culpados.

Sim, mas eu estava falando do blog e da minha centésima postagem, mas as porras dos zeros ficam como flashes na minha mente. - Vá lá, fale de mim e não das suas cem postagens, até porque se eu não existisse você não poderia definir, tão bem, a quantidade de postagens. Eu sou retado, eu posso definir, determinar, sou quase Deus; posso, pois, tanto lhe dar prazer, como tirá-lo. Não me importo se me acham despótico, ditador; gosto de ser assim, portanto, como sou quase um Deus, vá esquecendo da sua postagem de número cem, que se você quisesse poderia ser a de número mil, embora eu não saiba se você consegueria leitores suficientes para ler tudo isto, e vá falando mais de mim e das minhas qualidades.

Vocês estão vendo que estou tentando afastar os zeros da minha “estória”, mas está sendo impossível. Queria falar de algumas postagens, mas o zero não deixa, me diz logo: “Você vai falar de como aprender a pagar dívidas? Não vai não: adoro aquela postagem porque ali eu fiz uma grande festa, e somente por causa de mim, da minha facilidade de multiplicação, você achou interessante o texto de Aristófanes que inspirou a sua postagem, embora eu ache que você queria mesmo era falar de mim para retirar a minha  importância aquela que tive para engrandecer as dívidas do personagem.”

Miserável de zero: pois não é que agora, que estou pensando neste cretino, vejo quantos zeros foram necessários para o personagem de Aristófanes se desesperar e procurar uma maneira “ilegal” legal de não pagar os seus “zeros” da direita?

Esqueço Aristófanes e o não pagar as dívidas, embora particularmente, isto seja impossível, e vou para a triste constatação: Que belo texto! Acho eu, mas aí o zero, de novo me cutucando: “Sabe quantos zeros estão incluídos naquela postagem? Ha.Ha.Ha....!Milhões deles, todos multiplicadores da negatividade. Eu fico orgulhosíssimo de mostrar ao mundo as cifras da miséria, do descaso, da impunidade, da imoralidade, da falta de humanidade, da falta de ética, da falha do direito, enfim, posso, apenas com o acréscimo de um dos meus irmãos à minha direita, acabar com a mentira, com a política apregoada pelos falsos defensores dos direitos humanos que somente sabem falar e não agem e deixam que os meus irmãos se acumulem à minha direita demonstrando o que eles tentam negar”

Sai para lá seu zero! Quero falar de coisas amenas, comentar meus posts. Se você não lembra, estou comemorando as cem postagens do blog.

- Já lhe disse que você poderia estar comemorando a de número mil, aliás, até eu ficaria orgulhoso de você, como ficarei, porque tenho certeza que, mais dia menos dia, você vai conseguir isto, embora eu tenha que admitir que vai ser preciso que eu acrescente alguns irmãos no saldo da sua conta bancária. Não se preocupe, porque espero que a negatividade se transforme em positividade, e você possa continuar tendo inspiração e escrevendo mais e mais.

Rapaz! Vou ter de parar: você está me atrapalhando e eu já não consigo me lembrar das postagens que quero comentar.

Cascais- Portugal

Praia do Piruí-Arembepe
 -Nada; você queria falar mesmo é de Portugal e de Arembepe, seus dois extremos atuais, ambos que lhe fazem acrescentar zeros positivos de negatividade na sua conta bancária, mas que você ama de paixão. Ambos merecem cada escrito seu e por isso mesmo você precisa ter paz e muitos zeros de direita positivos para continuar mostrando o que muitos não podem ver, mas podem sentir e se transportar, curtir através de você, sonhar guiados pelo seu sentimento, pela sua sensibilidade.

Olhe zero, vou parar; você tá querendo colocar palavras na minha boca, como a sua mania de ditador, você quer que eu fique aqui sem qualquer modéstia elogiando minhas próprias criações, sem qualquer pudor. Não quero ser narciso, portanto, vou ter de parar, mas antes tenho de deixar um agradecimento a todos quantos visitaram este blog. Muito obrigada mesmo! E que os zeros positivos de direita $$$$$$$$$ se multipliquem em suas vidas, Que os zeros positivos de direita tragam para vocês muita paz, muitas realizações, muitos sonhos realizados e realizáveis.

Viram! O zero, nem neste momento, me deixou em paz, então vou mudar o título da postagem: é o melhor que faço.

 Pirui- Arembepe


Arembepe, 10 de abril 2011

sábado, 9 de abril de 2011

Um dia de chuva

Está sozinha, uma constante nos últimos 10 a 12 anos de sua vida. Já se acostumara e há tempos que achava boa esta solidão compartilhada consigo própria e com as suas coisas, principalmente seu livros e o fiel e mais recente amigo, o “lap top”.

Dia feio para alguns, chovia, e ela deitada na rede olhava a chuva cair. Gostava de fazer isto, mui principalmente, sem intermediação de nada. Como estava na varanda podia ver e ouvir a chuva, a água caindo, o cheiro da terra subindo, respingos pelo corpo. A grama mais verde, viçosa, os cocos brilhando como se alguém tivesse passado vaselina neles, de um a um.

O telhado encharcado formava manchas aqui e ali. Uma goteira no meio da sala. Uma brisa leve entrando porta adentro, lhe fazendo arrepiar.

Quer estudar, se concentrar no que estava fazendo, mas é impossível, a chuva está linda, os pingos grossos podem ser visualizados com facilidade. A pitangueira, com a força da chuva, vai abortando as pitangas, as flores branquinhas caem uma a uma, não agüentam a força d água. O bouganville esta sem flores, não gosta de chuva, adora sol e, portanto, recolhe as suas flores “lilases”.

Às onze horas não abriram nem as onze, nem as doze, e não vão abrir mais, elas também gostam do sol.

As duas  amigas, no seu cantinho, ficam ali balançando as suas folinhas verdes finas e elegantes, sempre eretas, mas as flores que dão suporte ao nome estão retraídas, não saem. Devem sentir falta da mão que lhes colocou naquele refúgio.

A palmeira também não gosta da chuva, mas mesmo assim, as suas folhas estão verdes.

A chuva aumenta, ele vai ter de sair da varanda, vai deixar a rede, vai para dentro de casa, agora vai ver a chuva através dos vidros. Verá imagens distorcidas, porque o vidro é canelado, mas a cor é nítida, o verde da grama, o verde das palmas do coqueiro, a silhueta do bougainville, tudo muito bem definido.

A entrada da casa fica linda na chuva, as cores contrastam; o branco do muro e o verde da grama, a madeira do portão, tudo harmônico. O céu está cinza, mas isto não importa, amanhã ele retornará intenso, azul e branco.

Hoje o dia é para admirar a chuva e o seu efeito, não é para lembrar de sol e nem de céu azul.

O dia é cinzento e belo como deve ser um dia cinzento, propício ao aconchego. Pensa na música de Djavan e, fatalmente, lembra de quem muito gostava do compositor. Lembra do verso. “E o meu jardim da vida ressecou, morreu, do pé que brotou Maria, nem Margarida nasceu”. Entende o verso, mas não concorda com a discriminação, Maria,Margarida são belas e iguais.

A voz cálida de Caetano Veloso sai da casa vizinha e alcança a casa dela, volta no tempo, pensa em quantas vezes e em quantas situações já ouviu aquela música. Uma vez ela lhe foi oferecida pelo próprio autor, não que ele o fizesse “spont sua”, um amigo pediu para que ele o fizesse, e ele o fez: “[...] Você é linda e sabe viver, você me faz feliz, esta canção é só para dizer e diz[...]” Não quer recordar, levanta vai até a porta da frente, pela greta do portão vê que a rua está cheia de água barrenta. Um carro buzina, insiste, ninguém vai atender, porque chove mais e mais.

Ela continua só, volta e deita novamente na rede e, deitada na rede, lê Lombroso e a sua teoria sobre os criminosos natos e pensa consigo mesma: Será que Lombroso teve alguma vez, um dia deste? Será que ele parou um dia para ver a chuva cair e pensar em absolutamente nada, apenas olhando e se encantando, constatando que realmente existe uma força enorme, grande, envolvente, que é capaz de fazer dias quentes, escaldantes até, e no dia seguinte manter o equilíbrio natural com um belo e gostoso dia de chuva, como o de hoje? Não, ele não devia ter tempo, estava muito preocupado em analisar os sinais exteriores dos “delinqüentes” e estereotipá-los de uma maneira cruel. Com Lombroso o nascer feio e nordestino já deveria ser um grande indício de criminalidade latente. Ah! se ele hoje vivesse para ver um menino dos olhos azuis, alto, com crânio “dolicéfalo” (alongado) delinqüindo como qualquer um dos seus estereotipados de crânio “braquicéfalo” (arredondado,achatado). Que faria ele?

Quer desviar o pensamento de Lombroso e olha o peixe de acrílico pendurado na parede, está todo molhando, parece que agora está mais próximo do seu habitat.

Mais uma música chama a sua atenção, esta vai bater mesmo lá no fundo, lembra do tempo que ao entrar no carro do seu “amado” ele sempre colocava a fita cassete, ainda era assim, “Quando a luz dos olhos meus e a luz dos olhos teus resolvem se encontrar...” Tem vontade de chorar, mas resiste, afinal, ela só estava olhando a chuva e não queria lembrar-se de nada, não queria ter saudades, queria apenas ver a água cair limpando tudo por onde passasse, purificando o ar, lubrificando a vida, deixando a natureza mostrar toda a sua potencialidade

A chuva continua, mas a música conseguiu quebrar mesmo todo o encanto, vê que não está tão sozinha assim, pois a sua vida foi invadida pela vida de outrem que, por motivos diversos dos seus, gosta da música que lhe transportou ao tempo em que podia dizer que era “amada” e amada de alguém.

Vai para a chuva, talvez a água possa tirar de si as lembranças. Brinca embaixo da chuva, volta a um tempo em que não tinha lembranças, apenas esperanças. Olha em redor e vê o verde, sorri. Sai da chuva se enxuga, volta a estudar, está clorofilada.

Arembepe, abril 2011