Quando estive em Maputo – Moçambique, fiz muitos comentários a respeito da sujeira da cidade, da pobreza, do tóxico, da prostituição das jovens, transportes públicos, dentre outras.
As críticas, infelizmente, falavam de coisas reais, do que vi, do que presenciei.
Voltei para Lisboa, e talvez por isso mesmo eu tenha achado que Maputo era tão suja, não que Lisboa, em alguns sítios, não o seja, mas por estar acostumada com o sistema de coleta de lixo da cidade, principalmente onde vivo, em Carnaxide, em que não se vê acúmulo de lixo, embora, como em todo Portugal, os dejetos do “melhor amigo do homem” insistam em sujar toda o país. É que em Lisboa os donos de cães utilizam a rua como sanitário publico para os seus bichos de estimação, sem o menor respeito pelo cidadão, que a qualquer momento pode escorregar na “merda”, cair, ficar machucado, simplesmente pelo fato de que os educados proprietários de cachorros, acham normalíssimo o fato de levar os seus cães para fazerem as necessidades na rua, exercendo, assim, o direito de “cidadania” dos pobres animais.
Acho mesmo interessante conversar em Lisboa com os proprietários de cães, que levam os seus animais para fazerem as necessidades na rua; eles acham que tem direito a isto e que não incomodam ninguém pois fazem isto altas horas da noite, certamente para encobrir a sujeira e achando que assim, estão preservando os demais. Alguém chegou a me dizer, quando argumentei que os animais sujavam tudo, calçadas, jardins, grama, etc. que o cachorro dela era educado, que ela tinha o cuidado de levar o bicho num cantinho. É inacreditável, o português cobra tudo, tudo mesmo, faz criticas a tudo, se aborrecem por tudo, gritam uns com os outros, mas quando se trata de “animais” tudo é permitido. Imagine que eles se permitem levar os bichos para restaurantes e você tem de ficar comendo e espreitando o animal na mesa ao lado. Quem não esta acostumado com o bicho, quem não conhece o animal fica temeroso do que ele possa fazer e não adianta o dono dizer que ele é manso, que não faz nada. A questão é mesmo de educação, mas parece que em Portugal não se liga muito para isto. O hábito de levar os animais para sujar a rua está mesmo enraizado na população.
Pois é, não concordo com isto e acho mesmo uma grande falta de cidadania e de respeito para com o próximo, mui principalmente aquele que não tem animal e que é obrigado a andar com toda atenção na rua para não escorregar nos dejetos que decoram as pedras portuguesas, os jardins, as esplanadas.
Também falei de Lisboa com relação às drogas no Martim Muniz, Intendente, e adjacências e à mendicância, que no centro realmente é estarrecedor, pois os mendigos fazem casas de papelão nas portas dos grandes monumentos da cidade, a exemplo do teatro Dona Maria, das arcadas da Praça do Comércio, escadarias da estação de comboio do Rossio, no Martin Moniz, dentre outros lugares.
De Lisboa voltei para o Brasil, para minha querida Salvador. Que tristeza. Nunca vi a cidade em tamanha degradação. O lixo tomou conta dela. Na Conceição da Praia é até nojento andar nas ruas sujas. A frente do Elevador Lacerda, cartão postal da cidade, é uma desolação. O cheiro de urina entra pelas narinas lhe revoltando o estomago. Não se pode passar nas calçadas tomadas de ambulantes, disputa-se lugares entre eles para não ser atropelado pelos automóveis quando se anda no meio da rua. Lixo por todos os lados, pessoas feias, mal encaradas, prostituas, desordeiros, bêbados, uma coletividade inútil complementando a sujeira do local. Lágrimas me vieram aos olhos, mas não foi só na Conceição da Praia que isto aconteceu. A cidade alta também esta na mesma degradação. Subi o Elevador e, apesar de chorar de emoção ao olhar a Bahia de Todos os Santos, chorei de raiva ao passar pela Rua Chile em direção a Carlos Gomes. Tudo feio e sujo. Uma grande decepção mesmo, e eu me lembrei de Maputo, e tenho de me penitenciar.
Salvador não está só suja, acabaram com ela, com um dos seus grandes atrativos que eram as barracas de praia. A impressão que tive foi que um grande tsunami ocorreu na orla de Salvador. O governo local retirou todas as barracas da praia, alegando questões ambientais e da construção ilegal na área. Engraçado é que estas barracas estavam nos seus lugares há muito tempo, e a lei sempre existiu, mas nunca ninguém tomou providência. Permitiram que os “barraqueiros” ali ficassem, fizessem o seu meio de vida, para, num belo dia, em que alguém amanheceu de “ovo virado”, mandar destruir tudo. Foi destruição mesmo. Agora não temos mais barracas de praia com banheiro, água, chuveiro, cozinha decente, mas se permite que comidas sejam feitas na praia, barracas sejam armadas, xixi seja feito na areia, enfim agora é que se está politicamente correto, e que os cidadãos estão exercendo os seus direitos “ambientais”. Até seria louvável a iniciativa se realmente fosse esta a questão, mas não é, tanto que agora, já se pode construir arranha céus na orla. Será que estas construções que já estão em andamento e as que estão por autorizar não são contrarias às normas ambientais? Será que a retirada destas barracas não é uma maneira de preservar, dar segurança àqueles “classe alta” que vão ter condições de comprarem os imóveis de luxo que estão a ser construídos? Será que isto não é mesmo um favorecimento aos grandes empreendedores?
Como se isto não bastasse, estou andando de ônibus em Salvador. Terrível. Os ônibus sem qualquer conforto, sujeira dentro e fora dos ônibus, falta de cumprimento de horário, veículos sem quaisquer condições de trafegar. Os terminais depredados. A Estação da Lapa não tem condição de uso. Na verdade senti mesmo foi medo de estar ali.
Em São Cristovão não aconselho ninguém a tomar um coletivo. Aquilo deve ser coisa do Diabo, ou então estou pagando algum pecado que cometi, mas o pecado deve ter sido tenebroso, porque aquilo é mesmo uma provação. Fico imaginando o sofrimento dos trabalhadores que não tem escapatória, que não podem, como eu, tomar um taxi, sair dali e pegar um ônibus em outro local. Os ônibus não param no ponto porque os transportes alternativos “vans”, se fosse em Moçambique eram “chapas”, não permitem que eles se aproximem; resultado, temos que correr para o meio da rua para conseguir entrar neles. Um verdadeiro inferno. Além disto, os ambulantes estão por toda a parte tomando quase todo o passeio; os pobres coitados que vão tomar o coletivo ficam com uma nesga de passeio para aguardar a hora de se arriscar correndo para entrar no veículo e depois, aguardar uma outra forma de sucumbir: ser espremido dentro do próprio coletivo. É um verdadeiro horror, mas parece que isto não preocupa ninguém. O Sr prefeito de Salvador tá pouco se incomodando,agora está preocupado com as contas que o Tribunal de Contas do Municipio analisa.
Depois de tanta decepção, e já disposta a pedir desculpas a Maputo, fiz uma viagem para São Paulo.
São Paulo, para quem não sabe, é a capital financeira do país, não só financeira, mas o símbolo da nossa modernidade, da nossa cultura como um todo. Tudo acontece em São Paulo. Já há muito que não vinha até aqui. Ela me surpreendeu em muitos aspectos. Primeiramente fiquei orgulhosa de ver a modernidade. São Paulo tem metrô, tem sistema ferroviário - metropolitano, coletivos. Fiquei extasiada com as estações terminais, com as ligações, o transbordo, as conexões. Neste aspecto, se não fosse tanta gente a utilizar o sistema e ele já esta a precisar de expansão, a cidade não deve nada a nenhum centro europeu.
Andei na Paulista, fui a diversos shopping centers, fui aos Jardins, Alphaville, Ibirapuera, etc. Tudo maravilhoso. No entanto, no dia em que fui ao centro, que lástima! A Praça da República é um desalento, não recomendo ninguém a ir visitá-la. Deixe a República morrer, voltemos a Monarquia, talvez assim recuperemos a dignidade do local. A Praça em si está suja, porca. Marginais ocupam os seus espaços. A droga é cambiada em todos os lados, grupos de drogados se acomodam nos seus recantos. As carpas dos lagos já não se mostram porque a cor da água poluída sem limpeza não permitem que se exibam O lixo está espalhado em todos os lugares, as calçadas estão esburacadas. Quem vai até a praça se arrisca de todas as maneiras, pode perder a vida, como a bolsa e, por causa da bolsa, a própria vida.
A Avenida Ipiranga na altura da Praça da República está irreconhecível, sujeira por todos os lados.
Na Sé, outra decepção. Parece que agora temos um exército de desocupados ocupando os belos espaços de São Paulo, invadindo a história, mudando a história do nosso país. Fiquei triste, mais muito triste mesmo, mas, ainda assim, continuei a caminhada, queria ir ao Mercado Municipal, e efetivamente fui, até lá chegar mais sujeira, mais degradação, mais decepção.
Bem verdade que quando cheguei ao Mercado retomei a euforia de estar em São Paulo, pois aquele é um grande monumento. Volto a pensar em São Paulo como uma cidade bela, limpa, multicultural, uma grande metrópole, mas depois tenho de sair para voltar para casa, e aí, novamente, sujeira, pobreza, pânico.
Chego a casa sã e salva, a que custo. E aí me vem a certeza de que tenho de me desculpar para com Maputo, pois ela fica em Moçambique, África, que é, como se noticia, um continente pobre, subdesenvolvido, com uma quantidade imensa de analfabetos, doentes, subnutridos, embora dirigidos por grandes fortunas, que fazem parte de listas das mais ricos do mudo, embora, como as noticias demonstrem, as grandes ditaduras estejam caindo, o povo já não agjuenta mais.
Que direito tenho eu de falar de Maputo? Nenhum. Antes de falar de Maputo, preciso falar do meu próprio pais, da minha própria cidade, do lugar onde vivo. Maputo pode ter os problemas de que falei, pois esta incluindo num contexto de pobreza, de subdesenvolvimento, de analfabetismo, de doença, de fome. Mas como justificar tudo o que apontei no meu país em duas cidades completamente diversas – São Paulo e Salvador-? Uma representando o Sul e a outra o Nordeste, ambas com a mesma degradação, com a mesma sujeira, o mesmo descaso para com o patrimônio público. Depois, como justificar o que acontece em Lisboa, onde passo alguns meses por ano,em que encontramos todos os problemas aqui já referidos? Pois é: tenho de dobrar a língua quando falar de qualquer outro lugar agora, pois, como diria minha mãe: "Macaco não olha para o rabo”!
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