Cada encontro uma festa, cada olhar uma
emoção, cada toque um verdadeiro calafrio.
Sim, era assim que vivia aquele
imenso amor. Não tinham vergonha de nada, nem mesmo de demonstrar o amor que
sentiam um pelo outro. Bem verdade que ela não gostava de agarramentos em
público, mas também nem precisava, todos que os olhavam sabiam que ali existia
amor, cumplicidade, paixão.
A cada dia uma nova descoberta do
outro, a cada momento um conhecer, seja de defeito seja de qualidades.
Qualidades! Sim, ambos as tinham:
ele muito mais que ela, pois tinha uma virtude imensa, que era a paciência. Ela
muito menos paciente, dir-se-ia até mesmo nervosa, mas ele classificava o
nervosismo dela como ansiedade.
Brigavam, sim, brigavam, ou
melhor, tinham desentendimentos, a maioria deles provocados por ela, mas nada que um pedido de desculpa
não resolvesse, as vezes nem necessitava a desculpa, um simples olhar e já
estava tudo mais de que esquecido.
Nunca viveram juntos, é verdade,
e talvez por isso mesmo é que as coisas funcionassem tão bem. Ambos ficavam
saltitantes quando marcavam alguma coisa, uma festa, um show, um passeio, um
café, enfim, só a perspectiva de estarem juntos já era suficiente para que a
emoção estivesse á flor da pele
Ela se arrumava para encontra-lo,
embora ele a achasse linda de qualquer maneira, aliás ele tinha verdadeira
tesão pela calça jeans, camisa, um cinto largo e as velhas botas de cano alto,
complementados pelo casaco e cachecol.
Ele sempre dizia que ela ficava maravilhosa de saltos altos, parecia uma
artista. Sim, ela bem o sabia, este tipo de roupa lhe caia bem, mas quando ela
estava de saia, vestido, era a mesma coisa, o olhar dele brilhava do mesmo
jeito.
Sabia quando ela estava com uma
peça nova. Percebia quando ela aparava,
minimamente, os cabelos. Se mudava o tom da pintura dos cabelos ele não deixava
passar desapercebido. Quando não gostava do que ela vestia, simplesmente nada
dizia, tempos depois, comentava que aquela roupa não lhe favorecia muito.
Ela estava encantada, um homem
como aquele nunca passara pela sua vida, parecia que ele adivinhava os seus
pensamentos, aflições, tudo.
Se gripava, lá vinha um chazinho
de limão quentinho. Dor de estomago, um chazinho de erva doce, uma dor de
cabeça uma grande preocupação. Se estava deitada com algum problema, lá estava
ele, juntinho dela, alisando a sua cabeça, ou apenas segurando a sua mão.
Adorava quando ele sabia que ela
estava preocupada, chorosa por algum motivo, ele deitava e fazia com que ela
deitasse e repousasse a cabeça sobre o seu peito e ficava ali lhe fazendo
carinho horas a fio.
Sabia respeitar tudo, cansou de
deixa-la sozinha porque ela precisava estar só naquele momento, ele percebia e
não lhe questionava, pois entendia que era o melhor para ela fazer a sua
introspecção.
Adoravam visitar lugarejos, lugares
pequeninos, onde a vida parecia ter estacionado no século XVIII. Ruínas,
muralhas, aquedutos, igrejas: quantas visitadas, ele até perguntava-lhe quando
estavam chegando em algum lugarejo pela
primeira vez: Primeiro a Igreja não
é? Sim, primeiro sempre a Igreja.
Gostavam de sentar em mesas das tendas que eram armadas nos dias de feira
destes pequenos lugarejos. Como se divertiam.
Qualquer programa estava bom para
eles, de feiras aos domingos pela manhã, a discotecas. O que gostassem é que
seria o programa do dia.
Divertiam-se muito, muito mesmo,
mas tudo tem de ter um começo, um meio e um fim. E chegou o dia do fim deles.
Tristes, chorosos, uma despedida que parecia tão remota, mas que tinha de
acontecer. Ele teria que arrumar algo para fazer em outro lugar, pois onde
residia as coisas estavam complicadas, e ele iria procurar novos horizontes.
Ela, por sua vez, acabara tudo o que fora fazer naquelas paragens, não havia
mais como continuar vivendo ali. Forçados a uma separação que não queriam, num
triste dia de outono, cada um para o seu lado, e pronto, tudo acabado, Resta, de tudo isto, ao
menos para ela, uma lembrança boa: conheceu um homem com alma feminina, um
homem que sabia dos sentimentos de uma mulher e da importância de um carinho,
de uma palavra, de um gesto, de um olhar. Um homem que respeitou tudo, até
mesmo os seus calundus.
Ela só pode agradecer e pedir
que, onde ele estiver, esteja bem e distribuindo, se não amor, mas o seu olhar,
o seu carinho, a sua atenção, seja para uma mulher, seja para quem precisar de
um amigo, de um companheiro.
Saudades.