-Sabe: Não sei como você me suporta! Estou velha, ficando muito chata, reclamando de tudo.
- Não, você não é chata, velha talvez, mas chata não, ta mesmo resmungona.
- Ué! Qual a diferença entre ser chata e resmungona?
- Todas. As pessoas podem resmungar e não se tornarem chatas.
- Mas eu reclamo de tudo; da vida, de você, dos amigos, do filho, enfim.
- Você não reclama: você fala da sua insatisfação.
-Porra, insatisfação é muito pouco para o que eu digo.
- Não, não se preocupe, eu agüento.
- É efetivamente eu não percebo como você quer ficar junto de alguém que só resmunga esta sempre zangada, aborrecida, mal humorada, e como vocês dizem: tem um mau feitio danado.
- Bom o fato é o seguinte: Se eu não estiver com você, vou estar sozinho, sem fazer nada.
-Puta que pariu!Realmente eu mereço ouvir isto. Sou mesmo uma opção miserável, a última delas, caso houvesse qualquer coisa melhor você não estaria aqui comigo.
- Não, espera aí. Não foi isto o que eu quis dizer.
- Você pode até não ter querido, mas disse, agora não tem jeito, nem tente reparar.
- Você entende tudo errado, parece que tem prazer em se aborrecer, em desvirtuar as palavras dos outros.
-Ah! É assim é? Alguém me diz que se não estiver comigo vai estar em casa sozinho, então prefere estar comigo, e você diz que não disse o que eu entendi.
-Claro, volto a repetir, eu disse que gosto de estar com você, e se não tivesse com você, estaria em casa e prefiro, pois, esta com você.
-Pô velho, você repetiu com todas as letras o que eu tinha entendido. Você só esta aqui e agora porque não tem mais o que fazer, portanto, eu sou uma opção porque você não tem opções; ou sou eu ou é nada.
-Fogo! Você realmente sabe trabalhar as palavras quando quer, aliás, como sempre, esta procurando problemas onde não existem. Eu estou aqui porque gosto da sua companhia, porque há alguns momentos que você fica sensacional, esquece as rabugices e fica normal e isto é muito bom.
-Bom, então você quer dizer mesmo que sou uma pessoa que tem duas fases, sou bipolar.
-Rapaz! Conversar com você é problemático. Não bote palavras na minha boca. Todas as pessoas têm seus momentos, e nem sempre eles são os melhores.
-Bom ao que parece, eu só tenho momentos piores. É isto que você esta dizendo, porque os melhores, parecem que são bem poucos, tanto que você é capaz de lembrar-se deles.
-Como é que é? Quer dizer que você tá dizendo que eu falei que os seus bons momentos são poucos e que eu me lembro deles?´
-É claro que você disse isto. Se você se arrisca a estar comigo com todo o meu mau feitio, meu mau humor porque “de vez em quando” eu tenho alguns momentos bons, é porque você lembra-se deles. Se eles não fossem raros tudo passaria muito despercebido, os momentos bons seriam normais e você, talvez, lembrasse somente dos ruins.
- Deus do céu! Que mulher é esta! Desvirtua tudo, complica tudo, parece que gosta de andar aborrecida.
-Viu que você me acha mesmo chata!
- Carraio! Vamos começar tudo noutra vez?
- Não, não vamos. Eu vou é embora. Não quero chatear ninguém com os meus problemas e nem quero que ninguém esteja junto de mim porque não tem mais nenhuma opção.
- É você tem razão. Quando você tá assim o melhor mesmo é ir embora. Tchau. Passe bem.
E ela vê o rapaz atravessar a rua sem olhar para trás, segue ainda com o olhar o seu caminhar, ele vai firme, cabeça erguida, não tem problemas, realmente se convence que ela é mesmo, apenas, uma opção. Não faz falta nenhuma, muito pelo contrário, deve ser um alivio para as pessoas se livrarem da sua companhia. Anda lentamente, segue para a paragem do autocarro, agora vai se aborrecer com as pessoas que nem conhece: uma porque cheira mal, a outra porque falta alto, a seguinte porque fala muito, enfim, dá asas a sua insatisfação até chegar à casa e ver o que efetivamente é: Chata, só, infeliz, deixando escapar tudo o que lhe possa trazer felicidade, alegria. Talvez nunca se acostume a isto, não dá a chance de se vir de outra maneira.
Se em algum momento deste diálogo você se viu, se identificou com alguma passagem; tome providências. Procure ser feliz, esqueça os problemas, ajude-se: saia, veja gente, fale dos defeitos seus e delas, brinque, critique, mas não permita que a vida lhe faça ser como a personagem desta conversa.
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