terça-feira, 17 de novembro de 2020

MÉDICO E PRISIONEIRO - LINDLEY NA PRISÃO

 

Realmente, sigo acompanhando as eleições dos Estados Unidos, pois fiquei muito surpresa com declaração do Sr. Biden, e até agora não percebo aonde ele quer chegar. Não posso deixar de concordar com o Presidente Bolsonaro no que diz respeito à Amazônia.  O que é isso, será que nos estamos aqui a mercê de um estadista americano, que nem se sabe se realmente será o Presidente  do pais mais poderoso do mundo, que acha que está em plena era colonial para querer intervir no território de outro país? Que diabo é isto? Em que tempos estamos?  Qual o interesse maior do Sr Biden na Amazônia?  Nossas riquezas ali? O nióbio? Enfim, qual o interesse Sr. Biden? Vai cuidar da sua terra, se você conseguir tomar posse, vá cuidar do seu país racista, vá tratar de humanizar a sua polícia, vá cuidar das grandes desigualdades sociais que existem nos Estados Unidos.

Pois, mas eu não queria falar de  zorra de eleição americana, quero mesmo é falar de LINDELY, o nosso contrabandista inglês, o contrabandista que não  fez qualquer contrabando, mas não posso deixar de fazer uma ligação entre  o inglês e  o que hoje está acontecendo  com a Amazônia:  o inglês veio  atrás de riquezas brasileiras, tanto que topou trocar as suas mercadorias pelo pau brasil, bem como  aceitou a amostra de “ouro” que lhe chegou às mãos através e um morador de Porto Seguro, o que não é muito diferente da atualidade, onde muitos estrangeiros se estabelecem na nossa floresta, negociam com indígenas, se  fantasiam de ONGS  com intuito de defender o verde, a natureza, os índios e a humanidade enfim, porque fazem questão de dizer que a floresta Amazônica é o pulmão do mundo, entretanto, o que eles na verdade querem é a riqueza que esta floresta  pode oferecer, seja com a sua flora seja com os seus minerais, todos sabem que existe  no solo daquela parte do pais  o nióbio, uma preciosidade para  os interesses  das grandes potencias controladoras da tecnologia .  Li que o nióbio  “é usado em ligas de aço para a produção de tubos condutores de fluidos, ele deixa o aço ainda mais resistente” e não só para isto, falam que até o acelerador de partículas  utiliza o nióbio em algum  dos seus componentes, não sei explicar isto, mas por este particular  vocês já podem  sentir a importância  deste elemento, que também é usado em turbinas de avião, carros, dutos de óleo e gás[1] . As maiores reservas de nióbio estão aqui no Brasil, segundo dados 98,4% e pode ser encontrado em Minas Gerais, Goiás, Amazonas.  Esta invasão de ONGS estrangeiras na Amazônia, bem como as interferências de outros governos, nos parece uma invasão da nossa soberania, o que efetivamente, não pode ser permitido.

Voltemos, entretanto, ao nosso inglês e à sua estória enquanto esteve aqui no Brasil, especificamente na Bahia, entre Salvador e Porto Seguro.

Um fato muito curioso em relação ao inglês é que ele, apesar de ser acusado de contrabandista, em muitas ocasiões, entretanto, ele era chamado para exercer a medicina, mesmo não sendo médico.

Segundo ele, isto aconteceu porque:

Quando o meu brigue aportou pela primeira vez em Pôrto Seguro, fui visitado pela quase totalidade dos moradores do local, ignorantes que pareciam macacos a espiar tudo. E mal deram com minha caixa de remédios, indagaram de quem era e julgaram, certa ou erradamente, que eu deveria ser médico, e sendo estrangeiro, sem dúvida médico famoso.” (LINDLEY 1805:44)[2]

Inglês sacana, olhe o desprezo com que ele fala da população: “macacos ignorantes” e quão se achava superior a todos, ao julgar que por ser estrangeiro, o médico tinha de ser famoso, mas deixemos para lá estes pormenores, para nos focar mesmo nessa missão que, querendo ou não, foi quase que imposta ao inglês, que continua descrevendo a sua então mais nova aptidão:

Antes de cair a noite, várias canoas encostaram no navio transportando doentes, estropiados, cegos, todos sofredores e pobres (segundo diziam), alguns suplicando pelo amor de Deus, outros implorando em nome de Maria, Nossa Senhora. Como logo estabeleci o sistema de gratuidade, eles jamais me permitiram acabar com aquilo, até que, visitando um pobre homem atacado de febre maligna, caí doente, e, por felicidade, perdi toda a clientela. (LINDLEY;1805;44)

Na verdade, o inglês teve razão em declarar a sua felicidade por deixar de “clinicar”. Imagine o desespero, gastar todo o seu material farmacêutico, trazido para as eventualidades da viagem, com pobres miseráveis que não tinham condição de pagar-lhe.

Todavia a trégua em relação a essa habilidade do Lindley foi mínima, porquanto já preso, encarcerado, vivendo o pão que o diabo amassou, como vocês verão nos próximos textos, ele era chamado para atender doentes:

Agora são os clientes de nôvo, numerosos como nunca, não obstante estar eu proibido de falar com qualquer pessoa. Cada sentinela sofre de algum mal, ou traz-me parente, vizinho, amigo enfermo, além de outras criaturas que tem permissão do comandante para este fim. Em resumo: multiplicaram-se tão rapidamente as consultas reduzindo o conteúdo da minha pobre caixa, que o Senhor Tomás**(nome que me dão), gostaria de nunca ter-se atribuído  o oficio de curar, ou pelo menos, havê-lo exercido de modo mais profissional, sendo bem pago pelos seus remédios(LINDLEY : 1805;44-45)

Efetivamente o homem tinha razão, ele que estava ali jogado às traças, sem dinheiro, preso, numa situação vexatória, ele com a sua mulher, poderia, ao menos, ganhar alguns trocados com esta habilidade que lhe fora atribuída pelos da terra.

Agora veja bem o contra senso. O homem era um criminoso, entretanto, era chamado para curar pessoas, o que não lhe deu qualquer regalia em relação ao lugar em que esteve aprisionado, seja em Porto Seguro, seja em Salvador, era convocado até mesmo pelas autoridades maiores:

O comandante pediu-me que fosse ver um doente, num vilarejo além da cidade. Lá segui eu, acompanhado de um soldado, e o paciente era o Sr. Rodrigues da Fonte, de quem eu já ouvira falar. Tinha ele na véspera sofrido um ataque de apoplexia; percebi que estava muito mal, com a respiração ofegante e difícil, o pulso fraco e irregular, por vezes parando de bater. A medicação tópica e interna que ousei aplicar não produziu o menor efeito, havendo a natureza perdido toda a sua força e energia (LINDLEY:1805 p. 45).

Não foram somente esses casos, muitos outros se sucederam e falaremos dele no decorrer das crônicas, entretanto, nesse caso específico, o cidadão faleceu, e Lindley fala das condições insalubres em que o paciente se encontrava, o que contribuía para a sua piora.

Estava o pobre homem num quarto fechado onde não penetrava o ar puro e a luz; apenas uma vela era mantida sobre sua cabeça, enquanto ele jazia imóvel numa grande cama, que ocupava um canto do aposento, a cabeceira e um lado encostados na parede. Entre esta e o doente havia um certo espaço onde sua mulher e outras criaturas do sexo feminino se acocoravam, passando por cima do corpo do homem, quando era preciso. Na parte superior da cama estavam colocadas diversas pequenas imagens, uma perna, um pé, um espadim e outras relíquias. Uma coroa de madeira trançada era sempre mantida suspensa sobre o pobre homem, e o conjunto formava a mais curiosa mistura de moléstia, estupidez e superstição. O aposento, cheio de parentes, visitas e criados, estava muitíssimo quente e abafado; senti-me feliz ao deixá-lo, pois, nas condições atuais do desgraçado, minha permanência ali não poderia ser de qualquer utilidade LINDELY:1805;45).

Deixemos, no entanto, de lado, temporariamente, esta habilidade imposta ao nosso inglês, e vamos ao local da prisão.

Lindley e sua esposa foram jogados no cárcere da Casa da Câmara e Prisão de Porto Seguro[3], nos subterrâneos da casa, segundo o seu relato, um lugar nojento, cheio de lixo, insalubre, e ali ele teve de ficar, até que que as autoridades resolvessem a sua situação.

Olhe bem como ele descreve o lugar que o deixaram juntamente com a sua esposa:

“...determinaram que embarcássemos, conduzindo-nos ao longo da praia e, depois, morro acima, até a prisão comum. Levaram-nos a um quarto no pavimento superior da cadeia, em cujo assoalho abriram um pequeno alçapão, arriaram uma escada e nos mandaram descer até certa profundidade (cerca de quarenta pés), o que fizemos, penetrando numa masmorra abaixo do nível do solo, da qual se exalava um fétido miserável. Estava inteiramente às escuras. Deus sabe quais os nossos sentimentos. (LINDLEY; 1805:36)

Agora pensem  como o inglês e a sua esposa se sentiram ali jogados, quanto pior, acusados de um crime que não cometeram, sem ter ainda qualquer oportunidade de defesa, sem julgamento  de qualquer juiz, por ordem apenas da Comissão que fora enviada da Bahia( Salvador) para a apuração do crime.

Imaginem o desespero da mulher do inglês, que continua descrevendo a vexatória situação em que se encontravam:

O guarda da prisão favoreceu-nos com uma luz, vimos então a nossa terrível situação! Em três cantos do aposento acumulavam-se montes de sujeira, lixo, cascas de laranja e legumes etc. tudo em estado de putrefação. O ouro canto tornara-se de uma repugnância horrível por causa dos vários e míseros ocupantes que a masmorra encerrara. E tôda ela parecia jamais ter sido limpa desde a sua construção. Quatro dos meus marinheiros haviam ai sido confinados durante os oito dias anteriores, e acabavam de ser removidos para o cárcere ao lado, para que fossemos admitidos. Um banco isolado e duas tábuas formavam uma cama e isso construía o único mobiliário da peça. (LINDLEY 1805;36-37)

Vejam bem a humilhação a que o Lindley e sua mulher foram submetidos.  Foram recolhidos a prisão comum, onde todo e qualquer marginal à época eram recolhidos, sem qualquer regalia, sem qualquer privilégio, sem quaisquer cuidados, seja com a própria condição humana, seja em relação a uma mulher está no meio de prisioneiros outros, sem qualquer privacidade.

O inglês realmente comeu o pão que o diabo amassou, e a sua saga continuará ao longo de muitos meses, e eu vos contarei em pequenos capítulos para que vocês não fiquem massacrados com a leitura.

 

 



[1] Revista Galileu, edição 330, janeiro /2019

[2] LINDLEY, Thomas. Narrativa de uma viagem ao Brasil, Londres, 1805. Brasiliana, Vol. 343, Direção de Américo Jacobina Lacombe, trad. Thomaz Newlands Neto, São Paulo, Cia Editora Nacional 1969

[3] “As casas do Conselho (Câmara Municipal) e cadeia são de pedra e cal e muito suficientes. A Vila era cabeça de Comarca, nela havendo um Ouvidor, um juiz ordinário (presidente da Câmara), três vereadores e um procurador do Conselho, um capitão-mor de Ordenanças e um Vigário da Vara, Mas contava com poucos moradores. “o comum é serem pobres”. Luís dos Santos Vilhena, Recopilação de notícias metropolitanas e brasílicas, contidas em vinte cartas, edição anotada por H. Brás do Amaral, Salvador, 1922, Vol. II, p.547

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