Agora, em plena eleição “democrática”, tão democrática que
temos a chance de ver “espíritos a votar”, volto ao Thomas Lindley e ao ano de
1802.
O Governador geral, naquela altura Vice Rey, era o Fernando José de Portugal e Castro
o Marquês de Aguiar – Vice rei e Capitao general de mar e terra do Brasil.
Lindley em Porto Seguro entra em contato direto com o Capitão Mor –
Governador da Província, assim que ele chama, embora na verdade o homem fosse Ouvidor, Jose Dantas Coelho e com os seus filhos, aceita a proposta que lhe foi feita por Gaspar para trocar
as suas mercadorias por pau brasil. Ele aceita
esclarecendo:
“à proposta pareceu-me tão vantajosa
que não hesitei, exceto quanto à incerteza da permissão para exportar-se aquele
produto. Mas como a oferta partia do próprio governador, considerei meramente
nominal qualquer proibição que pudesse existir: assim, dissipadas todas as
dúvidas concordei com a troca” LINDLEY 1805: 26)
Tudo acertado, artigos do brigue selecionados pelo filho do Ouvidor em valor equivalente à carga de pau brasil que seria entregue ao nosso inglês, era só esperar o momento de seguir para pegar a mercadoria no Rio Grande. Acontece que, uma semana após este acerto, é comunicado que o acordo não poderia ser cumprido porque Gaspar, talvez por ter caído a ficha declarou que : “eles, os guardiões do comércio, iriam emprenhar-se em negócio ilícito”. LINDLEY 1805;26), caso o negocio fosse realizado.
Bom, mas o jeitinho brasileiro funcionou, àquela altura, o jeitinho português, e o Ouvidor e seu filho disseram ao inglês, que ele poderia arrumar esta mercadoria por outros meios,” e que não haveria qualquer embaraço ou posição da parte deles”, LINDLEY: 1805:26.
Vejam bem queridos leitores, olhe bem o que as autoridades,
responsáveis pelo cumprimento da lei, disseram ao inglês: Não lhe vou criar
qualquer embaraço.” Ora, esta afirmação
veio a calhar para as pretensões do inglês, que, na verdade, queria mesmo era
obter lucro e não hesitou em entrar de
cabeça na empreitada, mesmo sabendo da
ilicitude do negócio.
Assim, o ainda comerciante inglês, já fez um negócio ali mesmo em Porto Seguro, uma pequena
quantidade a ser entregue em dez dias. Com o que ele não contava era com uma
doença que lho infectou, pois “foi acometido de uma grave febre, que quase me
vitimou” (LINDLEY;1805:26)
A doença do inglês não impediu que uma parte da madeira estivesse pronta para ser entregue, e ele deu esta informação ao Gaspar, o filho do
Ouvidor, este, mais uma vez, sabendo na
merda que estaria se metendo, falou com
Lindley para que não recebesse tal mercadoria pois ele tinha” motivos secretos
e da mais imperiosa natureza para dar os
seus conselhos”,( LINDLEY 18055:27.)
Este conselho fez LINDLEY desistir definitivamente do negócio,
e fazer com que ele decidisse partir, assim
que o leme da embarcação
estivesse pronto, o que foi feito, embora, segundo ele, outros defeitos se apresentassem
no brigue, o que levou a deitar ferros[1]
no Rio Caravelas logo depois da sua
partida, que ocorreu em 25 de junho logo alcançado o Rio Caravela, porque
descobriu que a avaria era muito mais delicada do que ele tinha pensando, e ali procurou quem lhe
reparasse completamente a popa.
Grande azar o de Lindley, quando o brigue já estava quase
reparado, ele foi surpreendido, no dia
02 de julho, “com a visita de um oficial, acompanhado de alguns soldados que
subiu a bordo munido de uma ordem de apreensão
do brigue, o qual deveria conduzir a Pôrto Seguro, sendo a tripulação
enviada por terra ao mesmo lugar” (LINDLEY 1805:27.)
Não houve resistência por parte do inglês, e assim que o
brigue ficou completamente pronto foi levado para Porto Seguro, onde chegou a 11 de julho, onde já estava uma
Comissão, que fora enviada pelo Governador da Bahia, para realizar a prisão do
inglês, bem como de todas as pessoas com ele relacionadas.
De acordo com LINDLEY, foi a partir deste dia que ele
resolveu fazer o diário.
Por que o inglês foi preso, se ele desistiu do negócio?
Diria eu: o inglês foi preso por força da inveja, do desejo
de vingança, por querelas entre um particular e as autoridades locais: O
Ouvidor , que parece ter sido um mal pagador, devia a algum comerciante em Porto Seguro, e este
credor foi até a capital da província, ou seja, em
Salvador
Deveu-se minha prisão a informações
prestadas por um morador de Pôrto Seguro, que fora à Bahia com este propósito,
vingando-se da falta de pagamento de uma dívida do governador civil, a quem
acusava de comerciar em pau-brasil,
declarando, ainda, que o brigue estava carregado desse artigo. Acusou também os
dois filhos do governador bem como o capitão mor, de haverem realizado uma
expedição que subira o Rio Grande, acompanhados de empregados, índios e outros
homens, a fim de explorarem certa mina de diamantes que existia às suas
margens, e terem regressado com apreciável quantidade de pedras preciosas. E,
finalmente, acusou o governador de extorsão e de ser opressor de todas as
pessoas a ele imediatamente subordinadas”( LINDLEY 1805;28)
Com esta denúncia Lindley e sua pobre mulher foram jogados
às enxovias[2],
juntamente com a sua tripulação, sendo encarcerados, também, os dois filhos do ouvidor
(Gaspar José e Antônio Luís Dantas Coelho, o Capitão- Mor Mariano Conceição, Antônio
José Maranhão dono de um armazém e funcionários subalternos.
Imaginem em que merda o inglês se meteu, levando junto a sua
mulher, pobre coitada!
UM ano depois dessas prisões, também o Ouvidor Jose Dantas Coelho
foi preso juntamente com outros envolvidos no caso que o Príncipe Regente, Dom
João VI denominou “escandaloso contrabando praticado em Porto Seguro” ( Carta Régia
enviada ao Governador da Bahia em 1803.[3]
Bom foi assim que o LIndley e a sua esposa foram parar na
cadeia, e vocês não queiram saber que tipo de cadeia era a da época.
A saga do inglês e da sua família, prosseguirá num próximo capítulo,
lembrando que o inglês não comprou a madeira, não havia nenhum pau brasil na
embarcação, mas, ainda assim foi preso e jogado na prisão juntamente com a sua
esposa e sua tripulação.
[1] Deitar
ferros – ancorar, jogar a âncora
[2] Enxovias
– parte subterrânea das prisões. Geralmente úmida e escura, que, outrora
abrigava os presos por crimes graves ou de alta periculosidade.
[3]
Carta Règia – documento com o qíliaal o rei
dirigia-se aos administradores contendo determinações gerais e permanentes. A
correspondência é diretamente do rei aos administradores.
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