Zafira acordara tensa, não sabia
bem o motivo, mas estava ansiosa. Não
tinha passado bem a noite, não que estivesse sentindo alguma coisa, mas sonhara muito, sonhos estranhos envolvendo
muita gente de um passado, que se não queria esquecer, também não queria
lembrar. Sonhou com o ex sogro e, em consequência, com a velha casa da Fazenda
Jaboatão, onde fora recebida, ou melhor, onde teve a sua presença imposta por
motivos imperiosos.
O que estaria acontecendo? Perguntava-se ao levantar da cama. Ao seu lado a presença de sempre, que apesar
da ausência do ser, se fazia presente no
estar.
Levantou-se e foi vestir a roupa
da caminhada: se deu conta de que sempre vestia a mesma roupa, deu risada e imaginou o pensamento daqueles que sempre a
cumprimentavam pela manhã nas suas
andanças pela orla. “Será que esta mulher só tem esta roupa?” Sorriu, era assim mesmo, agora ela também se perguntava: `Porra
você só tem esta roupa? Era capaz de lavar a blusa e usar exatamente a mesma no
outro dia.
Sorrindo desta situação saiu para andar. Eram apenas 6:00 horas da
manhã, gostava de andar neste horário porque o sol era mais ameno, além do
mais, menos carros e menos pessoas. Depois das 6:30 o povo se bate pela passarela da orla e ela não gostava.
Quando voltou para casa foi
molhar a grama, coisa que sempre fazia; aliás, ficou especialista em trabalhos
solitários, pois era assim que vivia e quase sempre viveu.
Após molhar as plantas entrou em
casa para ver as noticias do jornal, se surpreendeu com as novidades: os
deputados fizeram, mais uma vez, uma grande sacanagem, normal para uma câmara
que se especializou em corrupção, em falcatruas, em jogos políticos, mas aquela
passara do limite, a interferência no judiciário é terrível, querer parar as
apurações que levariam a uma possível
condenação da maioria dos membros do
Congresso Nacional ( duas casas legislativas)
é inadmissível, mas é a meta, foi
a meta e será a meta, eles nem disfarçam.
Irritou-se, mas ao mesmo tempo
conscientizou-se que a Justiça será feita sempre, acima de tudo e de
todos, pois os membros do judiciário não se intimidarão e continuarão a fazer o trabalho
que vêm fazendo.
Seu companheiro estava sentado em
frente a si e comenta: Manoel lançou o
livro hoje, mandou uma mensagem aqui para mim.
Como é? O que você falou?
Disse que Manoel lançou o livro hoje e disse o
título do livro, que ela só entendeu metade, percebeu bem que o lançamento fora
feito pela Amazon.
Feitas as atividades do dia,
inclusive a mais atual que tem, que é
arrumar dinheiro para pagar contas,
ela sentou-se e pegou o computador para
comprar o livro de Manoel, afinal, ela fizera parte da estória de vida
daquele autor.
Quando estava em processo de compra do livro lembrou-se do sonho que tivera com o ex sogro e a casa da fazenda Jatobá e pensou : Será que Manoel vai falar daquela casa da Fazenda Jatobá?
Será que falaria dela, Zafira? Será que se reportaria à vida efêmera e ao
grande e fulgaz amor dos dois? Será??????
“Não se julgue tão importante
assim Zafira, você foi apenas mais uma a passar pela vida do Melinho”: possivelmente
sem grande importância tendo em vista o
que acontecera em uma passado que se ela
não queria lembrar, jamais poderia esquecer,
afinal daquele passado havia uma
prova inconteste de que, se não houve um
verdadeiro amor, houve uma grande e enorme paixão que fora vivida intensamente
a cada dia que a vida oportunizou aos
dois amantes.
“Será que Melinho tinha lembrado da cerâmica Zafira? Será que ele lembrou do quanto deram risada ao descobrirem que o lugar onde estavam abrigados
era coberto com telhas da cerâmica Zafira?” - Claro que não idiota: então
uma pessoa como Melinho, que a
abandonara sozinha com a sua dor, com o filho de ambos ainda com seis meses, ia
lá se ligar em uma telha da cerâmica Zafira.
Aliás, ela sequer entendia porque se lembrava ainda disto, já se lá iam
43 anos, e ninguém ia guardar um pequeno detalhe deste. Ela se lembrava apenas
pela coincidência, que não fora uma mera semelhança, e sim uma realidade, do nome da cerâmica com o seu próprio nome. Lembrou-se que comentara
na oportunidade: “Não sabia que era dona de uma cerâmica”?
Bom, enquanto não começar a ler o
livro não saberia o que nele se contém, então
o melhor era logo acabar com a compra e
esperar o download.
Sim, ali estava ela, Zafira, e a
sua “troupe” da qual Melinho passou a fazer parte, e somente, e exclusivamente,
por este motivo que os dois se encontraram.
Sim, foi uma paixão arrebatadora. Zafira não conhecera uma paixão assim
antes, nem mesmo com o seu mais querido namorado, aquele sim um homem de 1.90m
e lindo, tinha sentido uma coisa tão forte.
Por ser forte, foi intensamente vivida por Zafira, que se entregou mesmo
de corpo e alma, muito mais de corpo no começo, mas depois a alma se confundiu
com o corpo e ela já não sabia pensar, o
seu racional era a carne a carne era o seu espirito. Precisava da carne para
ter o espirito em paz, e a carne tinha
um nome: Melinho. Ele lhe fizera mulher,
e como mulher o seu corpo clamava por carinhos, por volúpia, por paixão, o que
teve durante algum tempo.
O que Zafira não sabia,
entretanto, é que o Sr. Melinho apenas
passava chuvas, não aguentava
tempestades e nem calmarias, sua vida precisava de ser vivida intensamente não admitia rotinas,
precisava pulsar a todo o tempo, a sua alma e o seu corpo precisavam de impulsos diários, mas impulsos novos,
desconhecidos, por muitas vezes perigosos, e Melinho, sem quaisquer pudores, deixou Zafira, abandonando-a como se faz com um animal de “desestimação”.
Nem mesmo um retorno desastroso
foi capaz de aliviar a dor passada por Zafira, que durante muito
tempo sofreu sozinha a sua dor, dor
intensa que a fez quase sucumbir, mas, como o próprio Melinho, um dia lhe
escreveu: “ mas você ressurgiu em mais belas e esplendorosas formas”, ela ressurgiu, lutou, venceu e
hoje ela se pergunta mesmo: “Será
mesmo que viveu tudo isto? Será que as semelhanças como meras coincidências
descritas por Melinho se referem mesmo a si?
Será que a ficção imitou a realidade ou a realidade foi uma ficção? Melhor pensar que tudo não passou mesmo de uma ficção, é assim
que vai encarar tudo o quanto foi
exposto ficcionalmente no livro de Melinho e, no final, agradecer, pois, ao menos
na ficção, reviveu uma grande história de amor que foi imensa e infinita
enquanto durou, entretanto ela se perpetuou pois o sangue dos Melo Rego
continua pulsando no rebento advindo desta bela, intensa, dolorida para uma das
partes, estória de amor.
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