O carnaval se aproxima e eu fico pensando nos belos carnavais de tempos atrás, quando os trios elétricos saiam da frente da Manon no início da Avenida Sete. Eram só três, salvo engano, o da Saborosa, o do Tapajós, outro que agora não lembro o nome.
Era fabuloso ir para a casa de minha avó, pois minha mãe só
deixava a gente sair com as irmãs dela, a gente era: eu e minha irmã mais
velha. Íamos de mortalha, todas faziam a roupa do mesmo pano. Chegávamos à rua lá
pelas dez da manha, cinco ou mais mulheres, e descíamos do ônibus, salvo
engano, ali pelo Garcia ou Campo Grande, dali íamos andando até é o Forte São
Pedro, e no caminho o frenesi já tomava conta de todas. Eu, que tinha 15 anos,
era objeto do cuidado das demais, como era bonita e muito desenvolvida para os
quinze anos, arrumava muitos galanteadores no caminho. Um em particular, me
acompanhou durante uns três ou quatro anos de carnaval. Quando eu passava com o
meu grupo pelo forte de São Pedro, ali estava ele, um belo homem: alto, moreno,
olhos negros, muito negros, mãos lindas. Não sei do resto, ele também usava uma
mortalha e sempre o mesmo comentário.
“Minha noiva, no próximo ano caso com você”. É verdade: acreditem, ouvi isto durante uns
quatro anos da minha vida.
Todas já sabiam, e se ele não tivesse no local, até dávamos
uma paradinha para esperá-lo. Trocávamos o nosso abraço e beijos no rosto,
ainda não tinha esta coisa de beijar, beijar, beijar, pelo menos, não me lembro
disto, também, tinha um nojo da zorra de beijar quem não conhecia. Um dia, por
causa de um beijo de um cara qualquer, quase apanho na Avenida Sete, pois dei uma
tapa na cara do homem na mesma hora; caso não estivesse na frente de um bar, e
nele não tivesse uma porção de rapazes, que abriram uma brecha para que eu
entrasse e impediram a passagem do homem, não sei se estaria escrevendo isto
agora, O cara se retou mesmo e partiu para cima de mim. Não me pegou por causa
da ajuda providencial do pessoal. Fiquei muito tempo dentro do bar, até que os
caras saíram e eu fui quase que escoltada até o ponto de ônibus.
Nunca arrumei namorados no carnaval, não achava legal mesmo,
mesmo depois dos 18 anos, e já com trios elétricos revolucionários eu continuei
ilesa. E olhe que eu pulava, literalmente, atrás do trio elétrico e dos blocos
da época: Internacionais, Corujas, Barão, Jacu.
Todavia, antes dos 15, também fazia carnaval, penso que até
os oito, meus pais nos levavam, a mim e a todos os irmãos existentes na época, para
o carnaval. Lembro da Avenida Sete onde
as pessoas colocavam bancos de madeira amarrados nos postes uns nos outros, que
não eram ocupados por quem não era dono, e se ocupados, quando os donos
chegavam, as pessoas saim sem qualquer problema. Minha mãe nos fantasiava a
todos, a fantasia mais corriqueira era a de cigana. Acho que a descendência espanhola fazia com
que a preferida fosse ela. Adorava o torso amarelo ou vermelho com aquelas
coisinhas penduradas na ponta, caindo na testa. Olhe que ficávamos bem bonitos,
os três, eu Elisa e Tininho, que já se vestiu de pirata, com roupa de cetim
toda preta uma tapa olho. As nossas lanças perfume douradas, uma bisnaga imensa
que não podia faltar, o saquinho com confetes e serpentinas eram as nossas
armas carnavalescas.
Há um tempo anterior, quando meu pai ainda pagava o Centro
Espanhol, que ficava na Vitória, íamos para os bailes infantis, depois tudo
isto acabou, e eu só lembro-me de ter ido ao carnaval com as minhas tias, Glória,
Natércia, Aércia e suas amigas: Ieda, Solange, Nildete, Jandira e outras.
Era bom mesmo nos programarmos: tínhamos um tio que era garçom
e ele nos fazia entrar, imaginem vocês, nos clubes da elite: Bahiano de Tênis, Associação
Atlética. No Yacht fui muito poucas
vezes, não por causa do tio, e sim por conta da beleza, namorei com alguns
sócios.
O que gostava mesmo, entretanto, era do dia de sexta feira,
se bem me lembro, de um baile de carnaval no clube dos médicos que ficava na
Boca do Rio, era uma epopéia para chegar e outra para ir embora, recordo-me de
ficar sentada, junto com muitos outros foliões, aguardando que o dia acabasse
de amanhecer e aparecesse o primeiro ônibus, para voltarmos para casa.
Não me lembro em que época, mas o carnaval da Bahia tinha
escolas de samba, se não eram escolas de samba, eram blocos que saiam com
carros enfeitados, pessoas fantasiadas, algum luxo.
Também adorava ir às festas do Fantoche da Euterpe, aquele clube
que ficava no Dois de Julho, não sei quem me levava, mas fui muitas vezes. Hoje acho engraçado lembrar como brincávamos
carnaval em salas minúsculas com chão de tacos formando desenhos extraordinários.
Acho que as salas tinham muitas portas, era um salão na verdade, mas que hoje
em dia seria minúsculo para uma efetiva festa de carnaval. As pessoas iam
fantasiadas, grupos de palhaços; grupos de colombinas: grupos de marinheiros:
presidiários. Eu, quando muito, estava com alguma saia de cós baixo em que
amarrava um lenço cheio de miçangas, uma blusa tipo “bustiê” e pronto, era uma
fantasia. Morria de medo de cair quando a orquestra tocava corre lambretinha,
que começava mansinha e depois acelerava, e era um Deus nos acuda. Ficávamos
ofegantes e felizes, e hoje posso sentir a pureza daqueles carnavais. Gostava
de sentir o frescor da lança perfume, e adorava o cheiro perfumado que pairava
no ar.
Ver as máscaras, algumas, não nego, me davam medo, era muito
excitante. Quando mais velha, ler as
criticas bem humoradas a tantas troças, que eram feitas sob diversos assuntos,
era mesmo muito interessante. O carnaval era um momento de efetiva liberação,
mas uma libertação cultural, onde as pessoas, talvez por se protegerem atrás
das máscaras, podiam criticar o Governo, a política, os patrões, sem o risco de
sofrer punições. Hoje a liberdade no carnaval só tem um significado: SEXO.
Lembrar as marchas carnavalescas que eram tocadas. Recordar os
concursos para a melhor música do carnaval, que eram feitos nos meses que
antecediam a folia, salvo engano, é encantador e dá uma imensa nostalgia. Esperar os desfiles de fantasia no Copa, ver
Clovis Bornay, Evandro de tal(que diziam que era baiano), e tantos outros
desfilarem com aquelas fantasias luxuosas, era um bom programa. Ver alguns
flashes do Baile do Bola Preta, penso
que era este o nome, era fantástico. O
fantástico fica por conta da proibição, pois minha mãe achava aquilo um
atentado ao pudor. Que engraçado, aquilo era um atentado ao pudor. Hoje eu não
sei o que ela diria ao assistir, em plena televisão, o pessoal de blocos não só
transando na rua, como se drogando, enfim, passando bactérias de boca em boca, tudo
de errado mesmo.
O Clube de Engenharia, este era mesmo fatal para as donzelas,
não tão donzelas assim, aquilo era comentado: antes, durante e depois do
carnaval. Não se saia dali sem um par. São muitas e muitas lembranças, que
devem ser sorvidas pouco a pouco.
Olhe, tenho saudades mesmo, e vou escrever mais sobre isto.
Por hoje é só, mas ainda tem muito o que falar.
Barroquinha Zero Hora, Mudança do Garcia, Cada ano sai pior, Barão,
Jacú, Apaches do Tororó, Cacique,
Filhos de Ghandi. Um pouco depois: Os Novos
Baianos, Caetanave, etc. etc. Realmente, já não se faz carnaval como
antigamente. “Tanto riso, ah, tanta alegria, mais de mil palhaços no salão, Arlequim
esta chorando pelo amor da colombina, no meio da multidão: Foi bom te ver outra vez, está fazendo um ano,
foi no carnaval que passou...”(Zé Keti). “Atrás do trio elétrico só não vai
quem já morreu, quem já botou para rachar aprendeu que é do outro lado de lá do
lado que é lado, do lado, lado de lá”; “Não se esqueça de mim, não se perca de
mim, não desapareça, que a chuva tá caindo q quando a chuva começa eu acabo de
perder a cabeça, não saia do meu lado....”(Caetano Veloso) A única coisa que não tenho saudades no
carnaval é dos macacões, que eram disputados: macacões
da Shell, Esso, e de tantas outras empresas eram mesmo um símbolo, até mesmo,
de status. Lindos, branquinhos, folgados, mas que davam um trabalho da zorra na
hora do xixi.
Nenhum comentário:
Postar um comentário