sábado, 25 de maio de 2013

Notícia de um falecimento


O dia amanheceu calmo, mas ela tinha uma sensação estranha, um presságio de notícias ruins, e, infelizmente, às 10:00 da manhã, tudo se confirmou.
O telefone fixo toca, ela segue para onde fica o aparelho.  Vai sem querer ir, era como se tivesse a certeza que não ia receber uma boa notícia. Todavia, tem mãe, irmãos, filhos e netos.
- “Alô”.
- “Bom dia, quem fala”
- “A senhora ligou para quem”
- “Para a Sra.  Cornélia Semog “
- “É ela”
- “Sra. Cornélia fui encarregada de lhe passar uma notícia desagradável, e o faço eu porque a família está transtornada.”
Tomou um susto e, imediatamente, recordou do seu amanhecer e do pensamento que teve enquanto se dirigia ao local onde ficava o aparelho.
- “Sim, pois não, o que houve”? E na sua particular irreverência: “Quem morreu”?
- “A Sra. já sabe?”
- “Sabe de que minha senhora”?
- “A Senhora está perguntado quem morreu, sinal de que já deve saber de alguma coisa!”
- “Sra. o que: Qual é o seu nome? Diga logo o que aconteceu pois está me deixando nervosa.”.
- “Meu nome é Izolda com “z” e sou amiga da família”
- “Que família minha senhora, adiante logo o acontecimento”
- “Bem que me disseram que a senhora era um pouco esquentada”
- “Pqp: a senhora vai falar ou não, se isto for um trote a senhora vai se dar mal”
- “Vou falar sim, é que a informação não é nada boa”.
- “Vou desligar esta merda, e a senhora vá sacanear outra pessoa”
- “Já sacaneei hoje, se a senhora entende assim a comunicação que tenho a fazer, já sacaneei umas três pessoas”
- “Caracas, vou desligar mesmo! “
- “Dona Cornélia se a senhora soubesse a notícia que tenho para lhe dar, a senhora me tratava um pouco melhor, com mais educação, porque eu que não tenho nada com a estória, ´que fui solicitada para falar consigo”
- “Sra. sei lá o que, Izolda com “Z”, eu vou desligar, não tenho tempo a perder, se a senhora não quer cumprir a sua obrigação “moral” acho eu, o problema é seu. Certamente, se alguém morreu e eu tiver de saber, no momento certo saberei, portanto, como não lhe conheço, como não tenho a menor ideia de quem tenha morrido que faça parte da minha relação de amizade, e se fosse alguém da minha família eu já saberia, até porque eu seria eleita, à unanimidade, para pagar as despesas funerárias, não vou ficar aqui   falando com alguém que não tenho qualquer relacionamento, afinidade, conhecimento, enfim, não vou ficar falando com a senhora.”
Bate o telefone e vai fazer as coisas que tem de fazer, mas a porra do telefone toca outra vez.
- “Dona Izolda com z vá a merda”
- Cornélia, sou eu Cornidilia:   Quem é esta Izolda com “z” que lhe deixou tão irritada? Por que você está tão nervosa? Então você já sabe o que aconteceu não é?”
- “Pqp, outra vez!!!  Eu não sei de banana nenhuma e parece que não vou saber. A outra estava neste mesmo papo e por isso já atendi assim. Mas o que foi que houve mesmo, você vai dizer logo ou vai fazer rodeios para falar? Se for assim eu vou desligar o telefone porque vocês estão me fazendo ficar nervosa”.
- “Calma Cornélia, você só tem de respirar um pouco, ficar calma, pois a noticia é realmente ruim.”
- “Que cacete, que notícia ruim é esta que vem de cagado. Dizem que notícia ruim chega logo, mas esta parece que não quer ser noticiada, pelo menos para mim, pois, ao menos, duas pessoas diferentes já sabem”
- “É:  por isso que ninguém queria ligar para você, todos temendo a sua reação!”
- “Rapaz, vocês tão mesmo de sacanagem comigo! Que diabo aconteceu?”
- “Não fale o nome do demo; neste momento o melhor é falar em Deus”
- “Cornidilia, vou esquecer da nossa amizade e do elo que nos une e vou mandar você para aquele lugar.
- “Cornélia é mesmo difícil falar com você: todo mundo tem razão mesmo, você é grossa, ignorante, nem mesmo num momento deste, e para te dar uma notícia desta, a gente tem de abrir qualquer precedente para você, não vou falar nada, procure saber o que aconteceu sozinha.”
 Cornidilia desligou o telefone na sua cara e ela, que já estava espumando de raiva, de curiosidade e tensão, ficou sem saber o que tinha conhecido. Pensou em ligar para alguém, mas desistiu: uma terceira pessoa ia ligar se o caso fosse mesmo importante, ela saberia, se é mesmo que alguém tinha morrido, da notícia.
Outra vez o telefone toca, desta vez o celular; ela olha o número no visor, não reconhece aquele número. Os três algarismos do início demonstram que a ligação não é local.
- “Atendo, não atendo, atendo, não atendo”. Continua olhando para número sem tomar qualquer atitude”.  Decide não atender e vai preparar alguma coisa para comer, mas outra vez o telefone toca, agora os dois começam a tocar concomitantemente.”
- “É realmente alguém que eu devo conhecer bem morreu, pois não é possível que tanta gente ligue para mim em um dia de sábado, neste horário, em que a grande maioria que conheço já está se preparando para começar “os trabalhos””
Vai atender o celular. De novo o mesmo número que não conhece. Não atende. Vai para o fixo, há um número que também não conhece e que não é local. Fica olhando os dois telefones; no pensamento   faz “uni, dune, te etc., o escolhido foi você”. Dá risada, pois só neste momento é que percebe o que significava uni, dune, ter, que tanto usou na sua infância para escolher alguma coisa, (um dois e três) e este pensamento faz com que ela dê uma imensa gargalhada e é assim que atende ao celular.
- “Sra. Cornélia Semog”
- “Sim”
 - “O meu nome é Cornelson”
- “Como”?
- “Cornelson,  é estranho mas é este mesmo. Sou de Bombinhas, Santa Catarina, estou indo para a Cornuália e, alguns amigos comuns  mandaram que eu procurasse a senhora, para me dar algumas informações sobre o local”.
- “Sr. Cornelson,  acho que lhe informaram erroneamente, não conheço a Cornuália, a não ser  através de um livro que li há tempos atrás. “Catadores de Conchas” acho eu, penso que fica na Inglaterra, Irlanda, não sei bem, portanto, não lhe posso dar qualquer informação”.
- “Como a senhora não sabe! Estou aqui na minha mão com um artigo escrito por si, e amigos comuns me deram o seu telefone.”
- “Continuo achando que houve um grande engano, ou uma coincidência extrema, pois nunca escrevi nenhum artigo, nunca estive em lugar com este nome, enfim, acho que por força do meu nome, Cornélia, resolveram me enfiar uma Cornuália, que não conheço, não quero conhecer. Esta questão de "corno" é assim, todo mundo sabe e quer tirar um sarro.”
- “Bom, mas não é possível, porque dias atrás encontrei um nosso amigo comum, que infelizmente faleceu, e foi ele quem me deu o seu número”.
- “Quem faleceu meu senhor”,
- “AH a senhora ainda não sabe, não posso crer, ele falava tanto na senhora, ele que dizia que a senhora foi uma das pessoas mais dignas que ele conheceu, que ele admirava tanto. A Senhora que deveria ser a primeira a saber, ainda não sabe do falecimento dele”.
“Pqp! Realmente hoje não é o meu dia: Olhe aqui senhor não sei das quantas, vou desligar e tenha um péssimo dia e que a sua Cornuália se transforme mesmo em uma grande "corno" e como manda a tradição, que o senhor seja o último a saber, aliás, o senhor, decididamente, está indo para o lugar adequado”
Desliga o telefone e já não aguenta mais, a curiosidade o nervoso a agonia. O celular toca de novo.
- “Vá a merda”,
- “O que? Que é isto Cornélia? Bom mas parece que você já sabe.”
- “Sei de que?
- “Sua reação ao telefone já diz tudo”
- “Tudo o que?”
-“ Do seu nervoso, da sua aflição, da sua angústia, mas não se preocupe, tudo vai dar certo, nós estaremos  aqui, juntos com você”.
- “De que você está falando Cornalina?”
- “Dele, obviamente, estou falando dele”.
- “Dele quem?”
- “Do pai de seu filho”
Danou-se, pensou ela, que tinha três filhos de parceiros diferentes.
- “De que filho cacete?”
- “Do seu marido”. Ele vai ser sepultado daqui a pouco, acho que daqui há umas duas horas. Das diversas mulheres que ele teve só falta você, todos estão aqui comentando a sua ausência, tem até aposta se você vem ou não.  Você devia vim, o enterro em si ainda vai demorar e se você vier agora ainda vai ter tempo de ver as mulheres todas se entreolharem querendo uma matar a outra, cada uma no seu nincho com a família, quero dizer ela e os filhos, você sabe que são muitas, isto aqui está mesmo hilário, você devia vim. Tem gente aqui falando que ele teve toda razão em lhe deixar, uma pessoa que é tão rancorosa, tão ruim, que nem no momento deste vem prestar solidariedade, tinha mesmo de ser deixada”.
- “Como é que é! Quem morreu mesmo?
- “Você ainda não percebeu? Ele, o pai de seu filho”
- Olhe, quer saber, não sei de quem você tá falando, se você no disser o nome não vou saber qual dos pais de um dos meus filhos faleceu, portanto... Além do mais, nenhum dos meus filhos me disse nada até agora, bem improvável, pois, que estejamos falando de algum dos meus maridos.”
- “O mais mulherengo mulher! Pois só de ex, aqui, tem umas quatro, só falta mesmo você para completar a zorra”.
Desliga irritada o telefone. Fica pensando, qual deles faleceu, se foi um de seus maridos, porque o filho respectivo não ligou para dizer,ele sim, ou um dos tios, é que deveria lhe ligar para dar a notícia.
O celular toca outra vez, olha o número, e reconhece o telefone, seu coração acelera.
“Alô meu filho, eu já sei de tudo, você quer que eu vá com você para o enterro? Se quiser eu vou. Nesta hora vou esquecer o que aquele sacana fez comigo e você, vou passar por cima de tudo, vou apenas lembrar que ele é o seu pai vou te dar apoio.
“Como é minha mãe? Meu pai morreu!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

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