domingo, 23 de agosto de 2020

As cinzas de Dona Yvone




Ontem, dia 22.08, eu e meus irmãos e mais alguns da família, fomos espalhar as cinzas da nossa mãe.  Ela estava aqui em casa comigo desde o mês de fevereiro ou março, acho eu. Coloquei a urna no espaço onde costuro, talvez para receber os fluidos de Dona Yvone, porque ela sabia costurar. Minha mãe foi sempre um faz tudo, mas faz tudo mesmo: era uma super mulher. Educadora, parteira, cozinheira, doceira, catequista, costureira. Ela metia as caras e ia fazendo as coisas. Não sei como se tornou parteira, mas penso que foi quando morávamos em Camaçari, pois ela acompanhava a velha parteira da cidade em diversos partos. Aprendeu a manha mesmo, porque fez muitos. Eu não teria coragem, sinceramente, mas dou Graças a Deus por ela ser tirada e meter as caras, porque com esta coragem ela ajudou muitos a virem ao mundo.
Bom, o certo é que minha mãe ficou aqui em casa dentro da urna, na verdade não era para demorar tanto, mas a pandemia chegou e a gente não podia se reunir para fazer esta distribuição das cinzas.
Acontece que tive que tomar uma atitude, com pandemia ou não, porque ela me deu pressa para fazê-lo. Pois não é que a danada me apareceu em sonho e me disse que queria mudar de casa, que não estava gostando daquela casa onde estava. Logicamente no sonho tratava-se mesmo de uma casa, ela morava em uma casa que ela dizia ser feia e queria sair dali, e, como sempre, eu tinha de me virar para fazer as vontades dela.  Acordei sabendo o que devia ser feito, tinha mesmo é de jogar as suas cinzas em algum lugar onde ela se sentisse, como sempre foi e quis, livre.
Falei com os irmãos que tínhamos de organizar isto. Em princípio pensei em colocar as cinzas no mar, entretanto, meu irmão Luciano me alertou: “Dona Yvone gostava era de matas, rios, plantas, portanto deveríamos colocar suas cinzas num lugar de muitas arvores.”. Concordei de imediato: Minha mãe era uma pessoa bem espiritualizada; Ela recebia entidades, dentre elas caboclos a exemplo de “boiadeiro”. Também tinha muita ligação com São Lazaro, Nana, Cosme e Damião.
Era de distribuir “flores” como ela chamava as pipocas do velho. Se bem me lembro, na segunda feira era o dia de fazer isto. Acompanhei muitas vezes minha mãe para as sessões da umbanda que ela frequentava. Presenciei muitas e muitas vezes as manifestações das entidades. Ficava preocupada e meio descrente, mas deixava que ela passasse pipoca em todo o meu corpo, que era o que sempre fazia quando o “velho”, (São Lázaro) chegava. A preocupação era por conta do corpo de Mainha, é que ela tinha problema nas articulações e as entidades velhas se contorcem muito quando se manifestam. Felizmente ela não tinha nenhum caboclo que bebesse: se tivesse aí a merda estava feita, porque minha mãe não bebia álcool no dia a dia, aliás ela não bebia nem no dia a dia, nem noite a noite, talvez a noite, quando meu pai era vivo, ela se embriagasse por osmose, porque o velho bebia para cacete, por ele e por ela.
Bom, Luciano sugeriu a reserva Sapiranga. É um belo lugar, com riachos, vegetação densa, trilhas, enfim, uma pequena floresta. Um lugar ideal para a finalidade que tínhamos em mente. E lá fomos nós. A urna foi comigo, no meu colo. Mentalmente eu ia falando com minha mãe, e tenho certeza de que ela estava me ouvindo. Não deixei de sacanear com ela, pois achei que ela não queria ficar comigo, mas eu bem sabia da vontade dela sempre. Ela nunca quis ser enterrada em gavetas, sempre me pedia isto: que era para enterrá-la em cova cavada na terra, Não consegui atendê-la num primeiro momento, mas agora não teria  desculpa, eu tinha de fazer o que ela queria que era voltar a natureza, ser uma parte dela, então  fomos lá na Sapiranga e cada um lançou um punhado das cinzas(cremamos os ossos).
Eu fiquei com a maior parte. Distribui as cinzas em todas as direções, inclusive na água. Foi um momento muito bonito. Um dos meus irmãos conseguiu captar alguns flashes. As cinzas formaram nuvens e se espalharam por entre as árvores, parecia uma coisa de contos de fadas, uma claridade imensa, por entre as copas das árvores o sol adentrava e as        cinzas ali flutuando entre aqueles espaços, a luz do sol fazendo o mais fantástico efeito.
Cumprimos o desejo de Dona Yvone, ela agora está no seu meio, com os seus caboclos, com os seus meninos, com os seus adorados e respeitados espíritos. Com certeza está muito feliz e nós também estamos.
De lá da reserva voltamos para a casa de Tininho, onde comemoramos juntos o momento, aliás comemoramos duas coisas, a volta de minha mãe à natureza e a formatura de Mariana. Falamos muito dela e de tantas coisas que aconteceram na nossa família. Vimos as fotos que foram tiradas dos momentos em que lançávamos as cinzas no ar. Lindas fotos, grandes flashes. Em casa, analisando as fotos, pude ver em uma delas, paralisando um dos vídeos, o rosto de minha mãe, acreditem, identifiquei o rosto dela em paz, muito tranquila, com a expressão de felicidade. Não me importa se ninguém conseguir ver, ou que não acreditem que consigo ver. Sei é que ela se fez presente fisicamente para nos agradecer. Agora ela é ar, terra, água e estará sempre conosco, mais uma vez se dividindo para dar um pouco a tantos quantos dela precisem.
Beijos mãe.   








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