Antes mesmo de
conhece-lo já ouvia falar dele, pois assim que passei no vestibular de Direito,
no ano de 1973, o meu pai disse-me: Vais ser aluna do professor Raul
Chaves. Fiquei intrigada, pois não sabia
que o meu pai conhecia este senhor, sim, este senhor, porque naquela época da
minha vida o Dr. Raul era aquele senhor do qual meu pai falava com tanta
veemência. Meu pai conhecera o Dr. Raul
na Renner, loja tradicional de roupas masculinas que tinha na Avenida Sete, na
altura do Relógio de São Padro, onde o Dr. comprava os famosos ternos brancos
de linho, aliás, que o meu pai também usava, porque tinha de se apresentar bem
no trabalho, no qual era uma espécie de modelo vivo.
Fui para a
faculdade curiosa, pois queria saber quem era aquele Dr, do qual meu pai falava
tão efusivamente.
Os dias se
passaram na faculdade, e eu continuava ouvindo falar do homem sem ter a chance
de conhece-lo, porque nos primeiros dois semestres do curso o aluno não pega
Direito Penal, entretanto, quis o destino me dar uma mãozinha, ou melhor, uma
mãozona, pois no segundo semestre do ano em que entrei na faculdade conheci o
pai de meu filho.
Por ter
conhecido o acadêmico Valdir tive a oportunidade de conhecer Ângela e Pedro, e
soube que ela era filha de Dr. Raul e, por causa disto, por ser Valdir amigo
dos dois acima mencionados, tive a honra de privar da intimidade da casa do
mestre e conhece-lo .
Nunca na minha
vida vou esquecer aquela casa branca de janelas verdes no Chame-chame, jamais,
em tempo algum: aquela casa presenciou um início, o durante e o fim de uma
relação, para mim começada para a vida toda, mas isto não e o mais importante
neste momento. Naquela casa privei da intimidade do Dr., Raul e de toda a sua
família. Fui acolhida por todos, Dona Myrthes, Lana, Reyne, Raul, Yvone e
Antonio Luis, e, particularmente, pela Ângela,
que junto com Pedro viraram quase os meus anjos da guarda por muito tempo, não
só meus, mas também do meu filho, que tinha dentro daquela casa “papeiro”, “colher de pau” e até uma
mamadeira, isto para me poupar de levar todas as tralhas quando para lá fosse
e muito amor e atenção.
Vivi meu
romance, participei de natais, de festas de aniversário, cantei as músicas de Ângela,
vi a felicidade dentro daquela casa, aprendi o que é respeito pelo próximo e
como um simples gesto podia significar tanto amor.
O Dr. Raul
tinha uma maneira especial de me tratar, era muito galanteador e me deixava
muito sem graça quando, participando da mesa de refeição dos Chaves, ele me
olhava e dizia-me que eu tinha um perfil grego. Lógico que eu achava ótimo,
afinal não é todo mundo que tem um perfil grego e muito menos ter isto
confirmado por Raul Chaves.
Lembro-me um
dia, quando todos estávamos nos preparando para sair, uma confusão danada
naquela casa, pois todos os amigos dos filhos do mestre eram ali acolhidos, e
havia muita gente para tomar banho se arrumar, enfim. Eu estava lá esperando a
minha hora do banheiro, quando o Dr. Raul abriu a porta do quarto dele e me
ofereceu o banheiro da sua suíte, onde ninguém entrava, para que eu tomasse
banho. Claro eu recusei, afinal, sabia do seu espaço sagrado. O seu quarto era
ligado ao seu escritório através de uma escada interior. Eu achava aquilo
fantástico e sempre pensei em ter um espaço assim para mim, aliás, ainda penso.
Ficava fascinada não só por este detalhe, mas por tudo, livros e mais livros,
alguns empilhados ao lado da mesa de trabalho, muitas coisas naquele recanto de
saber. Bom, mais estou falando do banho. Recusei, mas ele insistiu tanto que
fui tomar o banho, e o meu maior dilema era o sabonete. Vou tomar banho com o
sabonete do casal! Oh meu Deus que dilema cruel!. O que fazer? Tomei o banho,
usei o sabonete, agradeci e fui me arrumar.
Rapaz, nunca
pensei que um banho iria ter tanta repercussão. Então a Esmeralda tomou banho
no banheiro de meu pai? Usou o sabonete
dele? Ninguém estava acreditando muito, mas o fato é que foi assim mesmo.
Bom, então
posso ter isto comigo para o resto da vida, eu tomei banho no banheiro do Dr.
Raul Chaves e Dona Myrthes.
De outra feita,
lembro-me, ele queria me levar para uma viagem com ele para que eu o secretariasse.
Não fui. Não deu certo.
Um dia eu
cheguei na casa dele e ele me perguntou se eu estava aborrecida com ele por
algum motivo. Eu disse que não, e ele falou assim não me pareceu no avião. Avião!
Que avião Dr Raul? E ele passa a relatar o episódio. Disse-me ele que estava num
avião, acho que indo para São Paulo, não lembro bem, e que eu estava sentada em
uma das poltronas, Falou comigo de onde estava e eu não respondi: intrigado, depois que ele estava instalado e que o avião
levantou vôo, ele foi até a minha poltrona e, quando abriu a boca para falar
comigo notou que não era eu, e sim uma pessoa bem parecida. Dei risada, e disse
“ deve ser uma pessoa muito parecida comigo mesmo para o senhor confundir, mas
estranho apenas o fato do senhor achar que era eu e que não queria falar
consigo, isto seria um impossibilidade.”
Pois é, nunca
tive uma aula com o Dr. Raul na faculdade, mas não precisaria de aulas na
faculdade, porque as aulas que ele me deu dentro da sua casa, permitindo que eu
desfrutasse da sua intimidade, vendo um pai, um marido, um amigo, um pequeno
grande homem, que sabia receber e dar
amor, é impagável e vale mais que qualquer aula de direito, porque ele me deu
lições de vida.
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