domingo, 10 de abril de 2016

A Pestanejada do Pestana

Iaiá já estava casada há muito tempo; os filhos todos criados, uns casados, outros ainda não casados, mas homens feitos, enfim, tinha cumprido a sua obrigação para com eles.  Agora, dizia para si, é hora de curtir mais a vida com o meu Pestana, com quem estava casada há anos.
Conhecera o Pestana há muito, ainda era enfermeira. Era uma mulata bonita de fazer inveja a qualquer mulher e deixar homens boquiabertos. Sempre se arrumara bem, e não era a farda branca de enfermeira que lhe tirava a elegância, o charme, a graça, ao contrário: isto anunciava a sua beleza, pois a sua silhueta, por baixo do jaleco branco, atiçava o desejo dos homens, e por que não dizer: das mulheres também, que invejavam aquela colossal mulher desejada por todos.
Todavia o Pestana fora o vencedor daquela pescaria, e fisgou a Iaiá, com quem se casou e construíram uma bela família.
O tempo foi passando, e ambos, Pestana e Iaiá, envelhecendo; ela, entretanto, continuava uma bela mulher, mas Pestana começou a pestanejar, e Iaiá começou a perceber o desinteresse do marido, que cumpria com suas obrigações, mas não havia maior calor ou amor no relacionamento, embora continuassem juntos.
Iaiá sabia que o marido dava as suas escapadelas, mas fazia de conta que não sabia de nada, mesmo sabendo que até os seus próprios filhos conheciam a “amante” do marido, uma delas lógico, pois Pestana pestanejava muito.
O jogo era bem jogado, ambos sabiam que o outro sabia, mas não se tocava no assunto e a iam levando a vida.
Um belo dia, entretanto, Iaiá resolveu que estava na hora de dar um basta naquela situação, as coisas estavam chegando a um ponto que já não dava para ser tão conivente, e então resolveu fazer uma surpresa ao marido.
Pestana era um médico famoso, conhecido e, por conta disto, viajava muito para congressos, e nem sempre ia sozinho. Por força destas viagens profissionais, estava acostumado a viajar sem a Iaiá, viagens rápidas, de três, quatro, cinco dias. Iaiá já se acostumara com aquilo, e se algumas vezes acompanhou o marido, foi porque isto lhe interessava, afinal ela queria conhecer alguns lugares e enquanto ele estava no congresso ela estava perambulando pelas ruas das cidades onde eles aconteciam, e assim foi várias vezes.
Mas o Pestana era bandido, e dava alguns “Zignaus” na Iaiá, e lá dizia que ia para um Congresso, quando na verdade estava indo passear com algumas das suas amantes. Iaiá sabia, mas ele pensava que a estava enganando.
Um belo dia, entretanto, Iaiá foi informada de que o marido iria passar cinco dias em um Congresso. Efetivamente o Congresso existia, seria em São Paulo e ele recebera o convite como sempre. Iaiá ficou atenta. Ela conhecia bem as secretarias do marido, tanto a da clinica quanto a do hospital e procurou saber delas se as passagens já haviam sido compradas.
A secretaria da clinica era menos esperta, e além do mais gostava de Iaiá, e ai entregou a zorra, até por inocência. “Já foram compradas as passagens sim e o hotel já foi reservado”. Iaiá sentiu um frio na barriga, mas não podia deixar transparecer nada, e continuou o assunto:
- Sim, qual é mesmo o dia da viagem?
- Quinta dia 12
- O voo sai mesmo que horas?
- Dona Iaiá, o voo sai de São Paulo as 22h00min?
- Ah tá bem.
- E o hotel reservou um hotel bom?
- Claro Dona Iaiá, o Ritz. Place Vendome
- O Ritz é? Hum!
Chega o dia da viagem e Iaiá se controlando. Olhava para a cara do Pestana  com  uma cara de bicho e  ficava a imaginar a cena que seria protagonizada  por ela e com ela.  Mesmo puta da vida, dava risada da cara do “idiota”.
Assim que soubera dos planos do marido Iaiá comprou sua passagem e reservou o mesmo hotel. A surpresa tinha de ser grande, ele não podia desconfiar de nada: tudo pronto e chega o dia.  Pestana despede-se de todos como sempre. Iaiá permite que ele lhe beije a testa, muito sacaneada, mas despede-se como se nada estivesse acontecendo.
O voo do marido para São Paulo era as três, lá ele teria de aguardar umas quatro horas para pegar o voo internacional. Ela marcara o seu voo para as quatro, e assim que ele saiu para o aeroporto, ela pegou um táxi e também seguiu para lá.  Esperou que ele embarcasse para fazer o chek in. Tinha de ter cuidado para que tudo desse certo mesmo.
Chegou a São Paulo as seis meia/ sete horas da noite, e ficou escondida em um dos bares do aeroporto até a hora do embarque.  Foi a última pessoa a embarcar, só entrou na sala de embarque após a última chamada da companhia.
Tinha de ser a última pessoa a entrar no avião, isto fazia parte do plano, se chegasse antes o Pestana poderia dar um jeito de sair da aeronave, e isto era tudo o que ela não queria.
Assim que entrou as portas foram fechadas, e ela dirigiu-se para o seu assento, que era antes do do marido, que certamente estava muito ocupado com a sua amante, que não deu conta da presença da esposa naquele voo.
Avião decola, passageiros já podem levantar. Iaiá, que estava lindamente vestida, maquiada, bonita como sempre, levanta-se e dirige-se ao sanitário. Sim, agora era a hora! Para chegar ao toalete teria de passar pela cadeira onde o marido estava sentado. Perfeito! Era isto que ela esperava. E lá se vai ela cheia de charme em direção ao banheiro
- O que você esta fazendo aqui?
-Viajando. Aproveitei o seu congresso e vou dar uma volta em Paris? Mas não se preocupe, faça de conta que não estou aqui. Não quero estragar o seu Congresso.
Evidentemente que ela estava tentando um controle que até não tinha, mas ela precisava dar uma lição no Pestana, e isto era só o começo, o melhor ainda estava por vim.
O voo decorreu tranquilamente.  Iaiá não queria qualquer escândalo, ficou em seu lugar, embora atenta ao que estava acontecendo nos assentos detrás. Ficava todo o tempo a imaginar a cara do marido: O que será que ele estava fazendo agora?   E sorria intimamente.
 O avião aterrissa, Iaiá se apressa. Era fundamental que ela saísse do aeroporto antes do Pestana. Como ela estava só e a sua mala era de cabine, isto foi fácil, pois enquanto ele e a “amante” iam para a sala de bagagens, ela estava deixando o aeroporto e pegando o táxi para o hotel.
Chegando ao hotel, feito o chek in, ela senta-se em uma poltrona defronte da porta de entrada do hotel, onde pudesse ver e ser vista por quem entrasse.
Uma hora depois, quem entra pela porta giratória? Pestana e a senhora que estava ao lado dele no avião.
O homem quase tem um troço.  Pálido, tremendo, fica parado sem saber bem para onde se dirigir. “Saio”? Entro de vez? Falo com ela? O que faço?  Tudo isto passava pela cabeça do Pestana, mas Iaiá simplesmente levantou-se e dirigiu-se para o elevador indo diretamente para o seu quarto de onde não saiu até a hora de retornar ao aeroporto para voltar para o Brasil.
Chegou, reuniu a família, contou o que tinha acontecido.  Todos acharam incrível a sua coragem, uns deram muita risada, até porque  todos já sabiam mesmo que uma hora a Iaiá ia aprontar alguma, as coisas estavam ficando fora do controle do Pestana, que já não estava dando  muito bola para  o que falassem dos seus relacionamentos.
Tudo comunicado, inclusive a resolução da separação, que esperaria apenas o Pestana chegar.
Mas era final de semana e Iaiá, para complementar o seu plano, teve e aguardar até segunda. Iaiá era sócia do hospital, da clinica, enfim, tinha acesso a tudo, inclusive aos bancos, Passou o final de semana a procurar apartamentos. Escolheu um na Graça, uma puta cobertura, completamente pronta, mobiliada e tudo mais, era somente pegar as roupas e entrar, não precisaria fazer nada. Cara, sim, muito cara! Mas eles tinham dinheiro, e o Pestana ia ter de ficar caladinho. Ele voltaria apenas na sexta, pois havia dito que depois do congresso de cinco dias, ainda ficaria por mais alguns dias em São Paulo, pois queria fazer algumas compras.
Pronto isto daria tempo de tudo.  Iaiá acertou a compra do apartamento, fez pagamento à vista, fez a escritura e, na quarta estava ela entrando triunfante no seu novo lar. Um detalhe: os seus filhos a acompanharam, todos foram embora da casa onde viviam, lá pelas bandas do Stiep.
Pestana chegou na sexta feira e encontrou a casa fechada, sem ninguém, apenas um empregado ali para comunicar que Dona Iaiá e seus filhos tinham se mudado.
Dizem que o Pestana, hoje, continua vivendo com a “rapariga” que foi com ele para Paris, agora, aposentado, passa os dias cozinhando, o que ele sempre gostou de fazer, e sendo chamado de “velho maluco pela sua agora mulher”.
Iaiá ainda viveu muito, mas não o suficiente para rir desta pestanejada do Pestana.  “velho louco”!                     

“qualquer semelhança é uma mera coincidência”

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