Estou completamente
emocionada, vou caminhando vagarosamente subindo a ladeira que vai me levar até
a Sé de Lisboa. Hoje é um dia especial. Lisboa está em festa, aliás, em festas,
por onde ando vejo as pessoas sorrindo, felizes. Velhos, pobres, adultos,
crianças, homens, mulheres, jovens todos unidos em um só desejo, participar da
grande festa da cidade.
As velhotas e velhotes
são os mais alegres, parecem que esperam o mês de junho para colocar para fora
toda a vontade de viver, mesmo com todos os problemas. Todos saem de suas casas:
arraias vão pipocar aqui e ali, em uma praça perto, ou uma praça distante, não
interessa, o arraial vai acontecer.
Há uma multidão se
encaminhando para a Sé. A rua já está fechada para carros e os passeios já
estão cercados; passam poucos carros, somente os carros autorizados, agora é só
esperar. Consigo chegar na Sé, depois de ter passado pela Igreja de Santo Antônio
de Lisboa, aliás, o responsável por tudo isto que está prestes a acontecer.
Me posiciono o lado da
Igreja da Sé, dali vejo quase tudo e ainda tenho a possibilidade de comprar uma
imperial. A Igreja está fechada ao público. Os canais de televisão já estão posicionados,
há entrevistas e gente querendo aparecer de qualquer maneira. Eu estou no meu espaço,
de onde posso ver, sem ser vista, pois não gosto desta exposição, não consigo
perceber como o povo faz questão de ficar em frente à câmera.
De repente mais e mais
pessoas chegam e ao longe ouço as sirenes dos carros e motos da polícia, que
vem abrindo caminho para um cortejo que desconheço. Estou ansiosa, falam tanto
deste evento que acontece todos os anos e agora eu tenho a oportunidade de estar
aqui e participar dele, que estou mesmo curiosa e ansiosa. As pessoas vibram, Ônibus
chegam, muitos deles, de onde descem pessoas vestidas a rigor, mulheres de
longos, cabelos arrumados, homens de terno, crianças, enfim, todos estão
arrumados para uma grande solenidade. Alguém junto de mim explica que são os
convidados. Eles saem dos ônibus e adentram à catedral da Sé, somente eles
podem entrar. O público tem de ficar do lado de fora, a Igreja não comportaria a
multidão que se aglomera para ver tudo.
De repente um buzinaço,
olho para a ladeira e vejo um carro
lindo se aproximando, visualizo um Rolls Royce, Que maravilha! A seguir mais um carro antigo, depois mais outro, e outro, e outro, todos trazendo as noivas.
Eles vão parar em frente
a catedral e deles saem noivas felizes, radiantes, cada uma com o sorriso mais
largo que a outra, afinal elas foram escolhidas em meio há muitas que se candidataram
a este casamento que é feito todos os anos e patrocinado pela Prefeitura de
Lisboa. Este ano foram dezesseis, n ão sei se o número é fixo.
O público delira, é mesmo
fantástico poder participar disto e ver tudo tão de perto.
As noivas entram, a
televisão filma, entrevistas, etc. Todos participam e estão mesmo muito
felizes, a gente pode sentir que aquilo não é ´falso.
As noivas estão lá
dentro. A rua continua fechada e o povo ali esperando a saída delas. A cerimônia
demora. O sol está forte, mas ninguém arreda o pé. Já estou na quarta ou quinta
cerveja. O xixi já começa com as suas ameaças. Tenho de procurar um local para
desaguar. Olho em volta. Não vejo nada que possa parecer com uma casa de banho.
Tenho de arrumar um lugar, senão vou fazer feio. Tenho de perder o meu lugar.
Desço a ladeira até a Igreja de Santo Antônio, ali tem um restaurante que tem
um dos melhores, se não o melhor, pastel de bacalhau de Lisboa. Vou ter que
comer alguns (eles são pequeninos) e aproveitar e ir até o sanitário, apesar da
vergonha que tenho de fazer isto, mas não dá para aguentar. É o que faço. Tomo, apesar da vontade intensa
de ir ao banheiro, outra imperial, tinha de justificar o “mijador”, após a
segunda imperial tomo coragem e vou ao sanitário.
Um alivio total e pronta para
mais dez imperiais e para ver a saída das noivas, que agora começam a aparecer
à porta da igreja.
Elas saem mais felizes do
que entraram, cada uma com o seu séquito parentes, que ordeiramente se dirigem
aos seus ônibus já posicionados.
A esta altura a coisa
fica monótona e eu resolvo voltar ao restaurante dos pasteis de bacalhau.
Descubro que tem moela e peço uma, sento à mesa, a única que sobrava, só tem
dois lugares, um deles divido com um estranho, fazer o que? Tomo mais umas duas
imperiais e saio descendo a ladeira para alcançar a rua Augusta, já são quase
três horas da tarde. Lisboa faz um calor imenso. Caminho pela augusta e chego ao Rossio. A
cidade vibra, v ou para os lados da praça da figueira de lá vou entrar pela
mouraria a dentro, vi umas barracas armadas em um larguinho eu fica após
entrada do restaurante do Zé da Mouraria.
Bingo, já tem movimento.
Aquilo ali vai pegar fogo mais tarde, a sardinhada vai comer no centro, vai ter dança e tudo
mais. Vejo, defronte onde sentei, uma mesa enorme em frente a uma casinha com
duas janelas e uma portinha, e de cara associei à casa da Mariquinhas da qual a
Amália Rodrigues fala na música. Há na casa cortininhas de renda, lindas por
sinal. Há flores na jardineira que fica na janela e há, ao lado da mesa grande
uma churrasqueira que começa a trepidar.
À mesa há senhoras,senhores e crianças: Ouço um sotaque conhecido, e vejo que naquela mesa estão uns seis ou
sete brasileiros, integrados à comunidade eles curtem como os portugueses a festa de Santo Antônio.
Fico ali, bebo, como
chouriço assado, converso com os patrícios. Sei que vou ter saudades deste dia.
Logo mais vou para a Avenida da Liberdade ver o desfile das marchas. Marcha da Mouraria, Marcha de Alfama e muitas
outras. Penso que Alfama ganha. Vamos ver, o importante e participar, sorrir,
ver a alegria e é assim que oi dia 13 vai chegar..
Viva a Santo Antônio!
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