quarta-feira, 25 de outubro de 2017

Podia ser bem diferente

O relógio da sala badalava. Ela, acordada, ouvia do quarto,: duas, três, quatro horas da manhã. Inútil tentar dormir, melhor levantar e ir fazer alguma coisa; ler por exemplo. Pegou o livro, mas não tinha qualquer concentração para a leitura. Uma leve dor no peito que ela não entendia. Da última vez que falou com um médico sobre isto, após ter feito exames de sangue, eletro e outras coisas mais, ele lhe disse que isto era angústia.
Angústia! Que tipo de angústia é esta que doe tanto, que é dor física mesmo? É como se dentro do seu peito tivesse uma madeira que quer entrar em algum lugar e encontra resistência, então ela aumenta a pressão. É assim que dói. Dor passageira? Sim, mas frequente.
Por que esta angústia?  Agora que tudo já deveria estar completamente apaziguado, controlado até, aparece esta angústia? Por que e para que?  Sexagenários não deveriam sentir mais nada, principalmente dor no peito. Não é bom para saúde nem física e nem mental.
O tempo inexorável passou. Alguns sonhos vão ficar no caminho, não serão mais realizados, não há tempo e nem mesmo força física para eles. Então você, beirando os setenta, vai sair do seu país e morar em outro? Evidentemente que não, mui principalmente quem ganha em reais. Vai para onde?
As limitações começam, as enfermidades também, por mais que se faça exercícios, tente a alimentação saudável (kkkkkkkkk esta é boa), o tempo é inexorável e não dá para esconder os seus efeitos, mesmo com as plásticas rejuvenescedoras. Triste, até porque ela está pensando nisto de madrugada. Evidente que sabe que muitas pessoas, como ela, estão curtindo uma insônia, mas, puta merda: precisa ser assim!
Nunca teve problemas para dormir, agora parece que tem um reloginho biológico que gosta das três horas da manhã, ou será para lembrá-la que tem de rezar! Sim rezar, porque a porcaria do relógio, um deles, porque ela não satisfeita com um, tem dois, a cada um quarto de hora, toca um quarto da Ave Maria. Acreditem, é verdade.
Bom, se era para lembrar que tem de rezar, continua a oração onde o relógio deixou, mas de nada adianta, a sua angústia continua, parece até crescente.
Pega o computador e tenta escrever. Sim, ela adora escrever da vida e sobre ela, mas não da sua, e agora tem de colocar no papel o que sente, porque não tem amigos, não pode falar com ninguém das suas dores; pior ainda, se falar as pessoa  vão fazer comentários tais como: Com uma casa desta! Com a vida que você tem! Você está procurando problemas onde não tem.  Sim, ´problemas onde não tem: esta expressão sempre é utilizada pelo seu companheiro. Problemas onde não tem! Ah se eles soubessem quantos: a vida de um complicada: a casa de alguém que está caindo, é uma tia doente que precisa de alguém para tomar conta de si, é uma amiga com câncer de mama, é um sonho de alguém que não se realiza, é a sua própria sorte indefinida no momento, definida só na idade, mas indefinida em tudo mais.
Ninguém venha para cá dizer que todos tem a sua vida e que você tem de viver a sua sem se preocupar com a do outro. Engano! Não pode ser assim, não há como a pessoa afastar o outro desta maneira, mui principalmente quando o outro, se não tem afinidade sanguínea, tem a do coração. Como alguém pode estar bem se não pode, nem mesmo, ajudar o outro seja materialmente seja espiritualmente. Não, não se pode ficar bem. E não é a história de tentar ser “espiritualista” que vai resolver. Não, não é isto! O outro precisa é de coisas materiais, coisas físicas e não de conforto espiritual. Alguns até precisam dele, mas, antes dele, você tem de resolver o problema material, porque ele é premente. 
É, parece que ela vai viver angustiada ainda durante muito tempo. Não se conforma de não poder ajudar, não entende porque as pessoas tem de passar por determinadas coisas. Não pode ser feliz com tantas coisas acontecendo com pessoas   de quem gosta. Ninguém pode ser feliz assim. Chora muito, aliás tem chorado muito por toda a sua vida, pois sempre se preocupou em demasia com os outros: irmãos, amigos, até mesmo desconhecidos.
Uma vez, uma pessoa que se diz muito espiritualizada, lhe disse que cada pessoa tem seu carma, tem de passar por isto e por aquilo, e que a gente não deve nem mesmo tentar interferir. Não acredita que seja assim, que porra de destino miserável é este, que traz ao mundo alguns que, desde o momento do nascimento sofrem, passam necessidades, alguns nunca alcançam seus sonhos?  Não é correto isto, não pode ser assim.
Depressão!, Não isto não é depressão. Angústia! Sim, ´pode ser. Vai passar? Não, não vai, porque ela vai morrer assim, está envelhecendo assim, pensando, tentando entender, querendo uma igualdade que sabe não é possível.


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