E lá ia ela toda cheia de planos.
Estava feliz, estava a caminho de realizar um sonho, um pequeno sonho, mas um
sonho e prestes mesmo a materializar-se. A estrada ia passando, para ela era como se fosse a
estrada que se movesse, e não o carro onde ela ia feliz ao lado do parceiro que
se propusera ajudá-la no “ come true” daquele devaneio.
Organizara tudo, vinha
idealizando a coisa fazia tempo. Não poderia dar nada errado, não queria
incomodar ninguém nem fazer ninguém sofrer, apenas queria dar asas a sua
imaginação e fazer o que sempre tivera vontade, desde os tempos de menina,
quando os sonhos daquele tipo eram proibidos, tão proibidos e pecaminosos, que
nunca tivera coragem de revelá-los a quem quer que fosse.
Xitãozinho e Xororó cantavam
bolero e ela ria, pois aquela trilha
sonora fazia parte de tudo que ainda estaria por vim naquele final de tarde
inicio de noite em que tudo seria permitido e tudo poderia acontecer.
O verde ainda predominava na paisagem, do carro,
mesmo com a velocidade, ainda se avistava aqui e ali algumas coisinhas brancas se mexendo, vacas nelore pastando naquele imenso gramado,
que se perdia de vista.
Tudo perfeito até então. Nenhuma
detalhe esquecido. |A garrafa de Champagne, as taças, o queijo de cabra,
fatias de jámon, um paté , torradinhas, água mineral com gás. Na dúvida, mais
uma garrafa de champanhe por gelar, mas isto não seria problema, com certeza,
onde ia, seria fácil gelar, mesmo que acabasse o gelo que estava na caixa
térmica, onde tudo estava guardado. Mentalmente visualizou tudo que estava no
carro: sim, não esquecera de nada, tudo perfeito. O CD com as músicas, o
computador carregado, tudo, tudo
certo, aquela noite ia ser perfeita, nada ia estragá-la.
A estrada reta já dava os
primeiros sinais da proximidade do destino final, saída a 30km. Menos de meia
hora separavam aquele instante do momento ideal, correto, certo. Mais verde, mais água, menos luminosidade;
para Paraíso, aguarde no acostamento e
vire à esquerda. A entrada era perigosa.
Não tinha rótula, não tinha nada, apenas este
pequeno aviso, se alguém não estivesse atento passaria batido.
Entram na estradinha minúscula
que levava a Paraíso. Seria mesmo um
Paraíso? Quem já esteve no local garante que sim. O hotel reservado, não
quisera correr risco, mas depois de andar bem uns trinta km naquela estradinha
de pedrinhas que batiam no fundo do carro, começou a achar que não era
necessário ter reservado o hotel, correra um risco desnecessário, era melhor
chegar e pronto, mas preferiu correr o risco de que não ter onde ficar, ainda
mais que o objetivo era ficar exatamente no hotel convento: E se chegasse ali,
depois de toda aquela preparação e não tivesse um quarto? Melhor assim.
A noite já tomara conta de tudo,
mas havia uma lua que também parecia ter sido programada, aliás, assim podia ser concebida, pois ela
escolhera, propositadamente, aquela noite, exatamente porque sabia que a lua
estaria cheia e iluminaria mais os seus sonhos.
Agora percebia o acerto desta
escolha, a iluminação da estrada, onde não passava nem gente e nem outro carro, naquela paisagem
só o carro em que eles estavam e o caminho, que parecia estreitar a cada avanço
estava iluminado, graças a enorme lua que acompanhava o veículo...
De repente uma luz lá no alto e
bem distante: “Será ali, onde está aquela luz”?
- Acho que não, ainda faltam uns
vinte e cinco km.
- Tudo isto? E se esta estrada
afinar mais? Não chegaremos em lugar algum e teremos de voltar.
- Não se preocupe. Se ela
estreitar mais voltaremos.
- Só se for de ré.
- Kkkkkk, não se preocupe,
daremos um jeito. Se anime porque estamos muito próximos.
Calada, pois não queria que a sua voz
indicasse a sua apreensão, olhava
o riacho que acompanha a estrada. A lua permitia que ele fosse visto, e não só: permitia que a sua
beleza deixasse nela a vontade de pedir para parar o carro e entrar naquela água,
que de cima da estrada parecia tão clara, límpida.
Perdeu-se neste pensamento e o
tempo passou mais depressa. Percebeu que o radio do carro não mais tocava nada,
ali, naquela imensidão do nada, ele não
funcionava
“Seráque o computador vai funcionar?
Se não funcionar não posso colocar música e ela faz parte desta estória. Não,
não queria pensar nisto, mas o pensamento não se desfazia, entretanto, lembrou
do aparelhinho de CD e se tranquilizou, ouviria música sim.
A luz se aproximava vagarosa.-
Faltam somente cinco KM.
-Só!, aquela luz não deveria
estar mais perto?
-Não, aquela luz não é do hotel
para onde vamos, ela não teria condição de aparecer, porque o hotel não fica em
um alto.
-Não fica em um alto? Duvido.
Então o hotel não é uma velha construção de padres? Não é um convento antigo?
-Sim, lembre-se que
padres não são militares, e não precisavam de conventos em cimos de montanhas,
o hotel fica no centro da cidade de
Paraiso.
-No centro da cidade? Em local
muito movimentado?
- Paraíso! Local movimentado? Kkkkkkkkkk.
De repente ela vê uma placa PARAISO, 2,5km
Mais um pouquinho: “Prepare-se: Você
está há 1,km do PARAÍSO”
“BEM VINDO AO PARAÍSO”.
Um muro de pedra começa a
aparecer do lado direito da pista, uma mureta na verdade, mas pedras que
deixavam que os visitantes lhe adivinhassem a idade, muito velhas mesmo, aquilo
parecia um muro romano, se estivesse na Europa, certamente, estariam entrando
em alguma ruina romana
Um arco feito com as com as mesmas pedras aparece e eles passam por
ele e entram, efetivamente, em Paraíso.
As ruas de pedras faziam o carro
balançar. As casinhas todas fechadas, nenhuma janela aberta, ninguém pela rua,
parecia uma cidade fantasma, não fossem as luzas que se entrevia pelas frestas
e vidraças das janelas fechadas, parecia que nelas não morava ninguém. De repente uma praça enorme e, do seu lado
direito, uma imponente construção: uma igreja com três torres, toda pintada de
branco, cada torre com um sino imenso e, ao lado da Igreja, parecendo sair da
sua lateral como um apêndice, uma constrição de dois andares que se perdia de
vista, tão branca quanto a própria Igreja e com janelas e portas verdes.
-Meus Deus, quem faria uma
construção desta num lugar deste?
-Os beneditinos. Aquele era um
convento beneditino, que fora ali construído no século XVII. Ela procurara
saber de toda a história, que era mesmo fantástica, e por isso mesmo o
desejo de ali realizar aquele sonho que
de há muito a acompanhava.
Param o carro e entram pela porta
lateral semiaberta: Não há vivalma ali. Uma
companhia, daquelas que parece uma sineta. Batemos, não batemos? O que faremos
então? De repente, veem, embaixo da sineta, um papel e uma
chave: Hóspedes Juliana e Joshua,
chambre 10. Boas vindas e tenham uma boa noite.
-Será que só nós estamos aqui
hoje?
Ao lado da portaria uma escadaria
gigantesca. Toras de madeira trabalhadas imensas, seja na expessura seja na
largura: a escada devia ser formada por madeira de 2 a 2,5 de largura. E eles
pegaram as coisas no carro e subiram aquelas escadas, que ressoava
apenas as suas próprias passadas. Um claustro imenso aparece quando chegam ao último degrau, uma placa e uma seta indicam onde ficava o quarto que eles procuravam. O último
do fim do corredor ao lado direito. Enquanto se encaminhavam para o quarto
olhavam o pátio lá embaixo, muitas flores, um lago artificial, muitas e
muitas plantas e muitas, mas muitas mesmo,
orquídeas, que se amostravam sob a luz do lar. Ela queria vê-las todas e
de perto, mas àquela hora, pensa que tinha mais coisas a fazer de que ver
orquídeas.
Chegaram ao quarto; sim, ali havia sido, sem a menor dúvida, a
cela de um beneditino. Embora a adaptação feita para acomodar hospedes tenha
sido muito bem feita, não retirou a originalidade da construção e da sua
finalidade. Uma só janela que dava para
um bosque. A cama imensa, um antigo
móvel fantástico do lado direito. O armário embutido atrás de uma madeira rústica,
o frigobar que ali também estava instalado e uma passagem, que só de olhar lhe fez tremer; era uma passagem mesmo, entre
aquelas paredes de quase um metro de espessura, uma fenda que dava para um
vasto banheiro, fantasticamente trabalhado, mas cujo piso ainda trazia a marca
dos votos da pobreza feita pelos monges que habitaram aquele convento.
Ela estava radiante, aquele local
era parte do seu sonho, ela sempre sonhara em dormir num quarto daqueles,
depois que tomou conhecimento que os antigos conventos e castelos
medievais viraram pousadas, ela
alimentou aquele desejo de dormir em um convento, mas num quarto que já
pertencera aos padres, embora já tivesse dormindo, muitas vezes, nos
dormitórios coletivos dos internatos dos conventos por onde passou, talvez por
isso mesmo sempre tivera a curiosidade de saber como seria uma “cela” de um
padre ou de uma freira, pois nunca lhe permitiram entrar.
Olhou tudo, viu as toalhas
brancas, limpíssimas, as roupas de cama bem alvas, a coberta de fustão, enfim,
tudo arrumadíssimo. Abriu a caixa térmica e olhou se tudo estava sob controle,
tirou o queijo, o presunto, o patê e
colocou em uma bandeja que estava em cima do móvel.
Disse a Joshua que ia tomar um
banho e lhe perguntou se não seria
melhor darem uma volta na cidade para ver o que encontravam. Ele riu e nem disse sim e nem não, apenas aproximou-se
mais dela e lhe deu um grande e caloroso beijo, que a deixou bem excitada e sem
já sem muita vontade de repetir o convite.
Foi para o banheiro com a sua
mala. Entrou naquela câmara e ficava tentando entender porque ali, ao invés de
ser um local hiper quente, chegava mesmo a fazer um friozinho, quando tirou a
roupa notou o endurecimento imediato dos mamilos, que, a bem da verdade, já
estavam bem calibrados após aquele
beijo, prenuncio do que estava por vim.
Entrou no box e deliciou-se
naquela água fantástica, o chuveiro era mesmo fabuloso, estava ali embaixo
daquela cachoeira, deixando que a água quentinha molhasse todo o seu corpo, que nem percebeu Joshua entrando no banheiro e no box, só sentiu mesmo a sua
presença quando ele já estava agarrando-a, puxando-a para si e lhe fazendo os
mais diversos carinhos, aos quais ela não resistiu mesmo e, ali mesmo, se
amaram e muito.
Enrolados nas toalhas saíram
daquela câmara do prazer falando exatamente
do que poderia ter acontecido naqueles quartos. Lembraram de Humberto
Eco em O nome da Rosa e realmente
perceberam que em um lugar daqueles seria muito fácil mesmo
viver uma vida dupla, entre a santidade e a safadeza. Ali as paredes não
permitiriam que ninguém ouvisse o que se fazia dentro daquelas celas, dificilmente alguém seria salvo até
mesmo de um assassinato.
Vestiram a roupa e decidiram
procurar um local para um jantar romântico regado um bom vinho. Saíram caminhando do hotel e a
Praça parecia dormir, nenhuma pessoa, nenhuma porta aberta, só eram oito e trinta da noite. Deram a volta
inteira na praça e decidiram retornar ao hotel, talvez o restaurante do estivesse
funcionando, ao entrarem no hotel, mais uma vez, não havia qualquer pessoa na
recepção. Bateram a sineta, mas ninguém apareceu, deram uma volta pelo pátio,
olharam as orquídeas de perto, muitas e de diversas cores e formas, lindas, mas
gente que era bom, nada. Quando estavam
desistindo, viram mesas e cadeiras do lado direito e deduziram que ali seria o
restaurante, todavia, ao se aproximares constaram que as portas de acesso
estavam fechadas, ou seja, iam para o quarto mesmo, não havia Esperança de
encontrar nada aberto e nem qualquer pessoa para dar informações.
Chegaram ao quarto e ela foi providenciar
o som para colocar o CD, bem como tirar os petiscos da caixa térmica. Eles
teriam que comer ali mesmo. Pegou o Champagne, as taças, pediu a Joshua que
abrisse o Champagne, arrumou, da melhor maneira possível, os frios, o paté, as torradas.
Iam comer ali, na própria cama, fazer o que?
Começaram a bebericar a comer
alguns petiscos, entreamados com carinhos
que iam ficando ousados, aí, enquanto podiam controlar o desejo,
lembraram da música e pegaram o aparelhinho
para colocar o CD. Ligaram o bichinho na tomada, colocaram o CD e a música
começou: “Me manda embora e na mesma hora me pede para ficar, deste jeito... e
um barulho estranho e fogo saindo pela tomada e, de
repente, tudo escuro; apavorados arrancaram o aparelho da tomada e ficaram quietos ouvindo
os passos apressados que passavam pela porta do quarto e desciam as escadas.
- Porra, o que fizemos Joshua? O que aconteceu? Parece que o hotel está todo às escuras.
- Não sei, mas, possivelmente, a
corrente do aparelho é 120 e a daqui 210.
- Que merda, e agora? O que
fazemos?
-Nada, vamos ver se conseguimos
uma vela e vamos continuar a nossa festinha. Vamos abrir a janela para a
claridade da lua entrar, bem como um
ventinho, porque isto agora vai ficar quente, e pronto.
E foi o que fizeram. Tomaram o Champagne,
comeram petiscos, fizeram amor muitas vezes, de melhores formas, e, pela manhã,
acordaram cedo e, como entraram no hotel, saíram.
No caminho de volta muitas risadas,
principalmente quando colocaram o CD no
rádio do carro e a música começou: “me manda embora e na mesma hora me pede
para ficar”.
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