quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Dez mil visitações

No ano passado, no mês de abril especificamente e com a ajuda da Vera, eu criei o blog. Sempre quis escrever, contar coisas, agradáveis ou não, mas falar da vida, das  minhas experiências, das minhas dores, mágoas, se possível com muita ironia, fazendo com que  tantas coisas tristes pudessem se tornar motivo de risos para alguns e para mim mesmo. A par disto, também queria falar de história e de direito. Neófita, não procurei um nome chamativo para o  blog, um nome que chamasse atenção, e coloquei o meu próprio nome, sem saber que o Esmeralda Martinez era mais vulgar do que o que eu pensava, pois só nos Estados Unidos, acho eu, existem para mais de 300 Esmeraldas Martinez, uma lástima, muitas xarás; tenho uma xará que é travesti e que também tem um blog, pensem aí? É evidente que todas as Esmeraldas Martinez têm origem espanhola: são mexicanos, argentinas,  chilenas, venezuelanas, e espanholas mesmo. Fui muito pretensiosa pensando que só existia uma Esmeralda Martinez
Bom, mas não estou aqui para falar do nome do blog, e sim do próprio blog e da sua existência até o presente momento.
Pois não é que hoje, dia 28 de setembro, após um ano e cinco meses da existência ele alcançou a marca de dez mil visitações! Claro que estou surpresa e ao mesmo tempo entusiasmada. Nunca achei que o blog seria, sequer, visitado, quanto mais dez mil vezes.
Não pensem que eu visito o blog para que a estatistica  aumente, pois  eu  não teria tempo de ficar acessando-o a todo instante somente para fazer número, é visitação mesmo e de terceiro.
Durante todo este tempo eu publiquei 124 posts e um deles, imaginem voces, foi acessado  1600 vezes, não sei se o texto foi lido, mas  ao menos foi aberto.  É o “Eisbein mit sauerkraft”. Eu, pessoalmente, acho a estória muito interessante, (qualquer semelhança  com fatos reais é uma mera coincidência), entretanto, penso que existem textos melhores que ele, mas vai-se fazer o que? Acredito que toda esta visitação seja, efetivamente, pelo título do texto. Penso que  os motores de busca  me favorecem quando nome do prato alemão é colocado para pesquisa, só pode ser isto.
O segundo texto mais visitado é o “Triste Constatação”, um texto mais sério, tratando de problemas atuais,  tais como o racismo, discriminação, África. O número de vistitações não chega sequer à 50% do primeiro colocado, mas mesmo assim fico muito feliz, porque  se ao menos um visitante leu o texto inteiro eu ja me dou por satisfeita, porque  consegui levar a alguém uma critica, um alerta do que ainda acontece no mundo em relação  aos negros e aos emigrantes em geral, negros ou não.  Depois deste segue-se, com uma diferença gritante, Arembepe I e II e  outros mais, não me lembro da estatistica toda. Há textos bons e textos menos bons, mas um escritor, se é que assim posso me considerar, é assim mesmo, o seu estado de espirito influe no que escreve e as vezes compromete o texto. Fiz textos cientifícos:  tais como: “O Lobolo” “Madeirada”, “ Leis para o Ultramar”, “O Arquivo Histórico de Moçambique”, dentre outros. Contei a minha vida em alguns episódios, falei de amigos, de viagens, ajudei, tenho certeza,  que alguns  coinhecessem melhor Portugal, este país maravilhoso que terminei por conhecer bem e que me dá uma satisfação enorme de dele poder falar com a intimidade que o faço. Falar do Tejo, do Alentejo, do Norte de Portugal é mesmo sensacional e espero ter feito com que alguém  tenha seguido algumas das sugestões que dei em cada texto que escrevi sobre este país, aliás  onde tenho muitos visitantes, na estatistica do blog Portugal esta em segundo lugar em numero de acessos, claro que o primeiro é o Brasil
As visitações partem de muitos lugares do mundo, fico encabulada, pois ja tive leitor até na Croácia, passando pelo Japão México, Estados Unidos, Canadá,  Chile, Angola, Moçambique, Italia, Espanha, Portugal, Grécia, dentre outros e, naturalmente, o Brasil, que concentra o meu maior público, como não poderia deixar de ser. Evidente que não tenho a pretensão de que todas as visitações signifiquem uma leitura do texto, mas sinto-me importante, nunca pensei que iria alcançar esta marca, que tem mesmo de ser comemorada.
Quando completei  a centésima postagem, também fiz texto comemorativo,: “Os dois zeros positivos da direita”. Agora, que são quatro zeros positivos  à direita, tenho mesmo motivo para estar feliz e agradecida a tantos quantos visitaram o blog, seja apenas por ter nele caído por mero acaso, seja por  curiosidade de saber quem é mais esta Esmeralda Martinez, seja por ser mesmo um seguidor e gostar dos textos. Agora, com este marco de 10.000 posso me arriscar a publicar um livro com as melhores postagens, certamente as mais divertidas, porque o que quero com elas é mostrar a vida, fazer com que as pessoas possam rir de algumas situações, que apesar de tristes, são contadas de uma maneira tal, que  fazem as pessoas  sorrirem, que é o que mais desejo, pois sei o que o riso  pode fazer para o nosso espirito, principalmente nos dias em que achamos que a vida esta contra nós, que o universo esta conspirando contrariamente ao que queremos. Fazer gozação das nossas próprias mazelas, da nossa própria vida, é uma maneira inteligente de bem viver.
Obrigada a todos e sorriam sempre, o riso não só exercita os músculos da face, como faz bem á alma. Há dois textos que acho que todas as pessoas deveriam ler para dar boas risadas: “Propaganda Enganosa” e “Aprenda como não pagar dívidas”, ambos hilários. Quando puderem, e se já não o fizeram, leiam.
Um grande abraço a todos e, mais uma vez: OBRIGADA. 

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Dia de São Cosme e Damião

Hoje é o dia 27 de setembro. Na Bahia, e não só aqui, festeja-se os santos meninos- São Cosme e Damião. É assim mesmo, apesar de dois, parece que são um só, pois nunca ouvi ninguém falar de São Cosme e São Damião assim separando os “saos”.
Dizem, os que contam a história dos gêmeos, que eles são originários da Arábia, estudaram medicina na Síria, e praticavam o oficio gratuitamente, foram acusados de feitiçaria e, por isso mesmo, foram assassinados.
No candomblé eles são os filhos gêmeos de Xangó e Iansã, são os Ibejés, e tem mais cinco irmãos: Doú, Alabá, Crispim, Crispiniano e Talabi, este último, pelo nome, parece ser o mais árabe de todos.
Minha mãe, sempre ofereceu um caruru neste dia 27 de setembro, acho que, por isso mesmo, pela fé que tinha nos dois santos meninos, ela pariu um dos meus irmãos neste dia e, talvez por isso, o menino nasceu de 7 meses, de parto natural, feito em casa, por uma parteira gorda e bem velhinha, que disse ter sido enganada pelos meninos santos, porque ela tinha certeza que não era aquele dia do meu irmão nascer. Lembro-me de minha mãe contar este caso às amigas:
-" Ela disse que, ou os meninos queriam lhe pregar uma peça, ou então era o último parto que ela estaria fazendo."
Não sei se foi o último parto que ela fez, mas sei que logo depois, soubemos que ela, efetivamente, faleceu.
Bom, o certo é quem meu irmão nasceu de sete meses, em casa, na cidade baixa, na Rua da Imperatriz no dia 27 de setembro de ano que já não me lembro, recebendo nome de Cosme Antônio. O Cosme, por motivos óbvios, o Antônio em homenagem ao meu avô materno, que se chamava Antonio Regis Filho, para mim era o “meu príncipe porque nasceu louro e com os olhos bem claros e, logicamente, eu associei isto aos contos de fadas em que os príncipes eram sempre brancos, louros e de olhos claros, como se não pudesse existir príncipes negros, mulatos, ou amarelos.
Se o caruru lá de casa era oferecido antes do nascimento do Cosme, depois deste evento, aí sim, minha mãe nunca mais deixou de fazê-lo, até que as forças não mais respeitaram as suas crenças ou quando não tínhamos mesmo qualquer dinheiro, ainda assim, minha mãe distribuía balas de mel entre as crianças.
preparação
Sempre achei interessante esta estória de São Cosme e São Damião, que são os dois primeiros irmãos, de uma família de sete meninos. Minha mãe sempre fez o caruru com todo o tradicionalismo recomendado:
Acordava-se muito cedo, muita gente em casa cortando quiabos que ia aumentado de quantidade com o passar dos anos, já vi caruru lá em casa de mais de 1.500 quiabos; quiabos para danar e lenhar os meus dedos de criança.  Efetivamente era uma festa mesmo, as minhas tias, irmãs da minha mãe, todas lá, era dia de pernoite e todos trabalhavam muito, sem qualquer sombra de cansaço. Tudo era satisfação. Antes das ajudantes começarem, a pessoa que estava dando o caruru, a minha mãe no caso, tinha de cortar sete quiabos fazendo os seus pedidos aos santos meninos; depois disto eram escolhidos sete quiabos inteiros que assim iam ser cozidos e só depois disto é que as ajudantes podiam começar os trabalhos. No caruru de São Cosme os quiabos são cortados em quadradinhos pequeninos. Os sete quiabos inteiros são colocados junto aos quiabos cortados e, segunda a tradição, quem tem um quiabo inteiro no prato, tem de dar um caruru.
Antes de contar os quiabos, lembro-me que minha mãe se vestia toda de branco, arrumava a mesa dos santos, em que o lugar principal pertencia aos meninos: velas pequeninas e coloridas eram acesas em pratinhos brancos em numero de sete, estas “candeias” como ela falava, tinham de ficar acesas durante todo o dia, e às vezes, durante sete dias seguidos. A rua era “despachada” era assim que se dizia; afastando os maus olhados e os espíritos indesejados; água e sal grosso jogados de frente, nas laterais e por cima da cabeça. Eu olhava aquilo tudo sem entender direito, somente com o decorrer dos anos é que fui perceber, não na sua plenitude, alguma coisa de todo aquele ritual.
caruru

Minha mãe era incansável nestes dias, aliás, sempre o foi, nesses e nos outros; ficava feliz sempre, fazia tudo praticamente sozinha, porque a não ser a ajuda com o corte dos quiabos, tudo mais era feito por ela. Tratava 30 a 40 quilos de galinha sozinha, passava a noite fazendo este trabalho. Uma bacia grande em sua frente com os pedaços de galinha, tudo cortado no “muque”, ainda não se comprava galinha em pedaços, as bichinhas eram compradas inteiras, vivas ainda, e eram “assassinadas” lá em casa mesmo. A executora delas era minha mãe ou alguma tia corajosa. Após violentamente assassinadas, eram depenadas em um caldeirão enorme com água fervente, onde os bichos eram enfiados para facilitar a retirada das penas, depois deste processo, vinha o momento do destrinchamento. Sempre achei uma perÍcia alguém encontrar as articulações das bichinhas e tudo ser cortado no lugar certo. Eu, até hoje, não consigo encontrar o lugar certo do corte, talvez por isso tenha preferido direito à medicina.
O pior momento era ver a minha mãe colocar as bichinhas no chão, segurar os pés da ave com os dela, ou seja, imobilizar a bicha, e depois dar o corte fatal no pescoço. Não gostava nem um pouco dessa parte, mas, se tínhamos de comer a galinha de xinxim, não havia outra possibilidade. Se dependesse de mim, até hoje ninguém comia galinha, porque eu jamais saberia fazer isto. A minha falta de técnica e de coragem faria tudo virar uma lástima. Minha mãe sempre dizia que não podia se ter pena do animal e nem cortar no lugar errado, isto era fatal, porque a bicha, às vezes, meio morta e meio viva, ainda conseguia se libertar e sair tentando fugir pela casa, uma baboseira só, já aconteceu lá em casa em algumas oportunidades, ver a galinha, já sem cabeça ainda dando alguns passos pela casa e melando tudo de sangue, um horror!
galinha de xinxin
O ritual da galinha acabava e os pedacinhos eram cortados quase que milimetricamente, afinal, todos tinham de ter um pedaço da carne no prato, e isto significava cortes precisos de tamanhos minúsculos. O peito de uma delas era sempre cozido inteiro, porque este era o que seria colocado no prato dos santos, que eram três pratinhos de barro, complementados com as três jarrinhas coloridas cheias de mel, e as “balas” também de mel.
O caruru de minha mãe era completo, tinha de rapadura cortada em quadradinhos mínimos a vatapá: tudo enfim: inhame, banana da terra frita, coco, acaçá, acarajé, abará, cana de açúcar, abóbora, pipoca, o caruru, feijão fradinho, feijão preto, arroz, milho branco, farofia de mel e a de dendê, batata doce. Comida para dar, vender e emprestar.
O camarão seco, principal ingrediente do caruru já estava guardado e pronto para ser utilizado; era a primeira coisa que entrava em casa para o caruru, ele precisa ser descascado com antecedência, minhas mãos ficavam fedorentas e as pontas dos dedos sujas e machucadas, quando não furadas, mas eu gostava daquela tremenda confusão que se armava nos dias que antecediam a festa dos meninos.
ultimo caruru em Arembepe
Lá em casa todos participavam, seja ajudando, seja comendo, a grande maioria estava nesta ultima opção. Meu pai, pense ai! Um espanhol legitimo adorava estas farras, ele também entrava no jogo e, por algum tempo, respeitou os ritos, imagine que passava o dia sem beber, ficava de roupa branca, era incensado e ainda ajudava a levar a comida do santos: é que depois do terceiro dia que essa comida estava no altar aos pés dos santos, tinha de ser retirada colocada num matinho verde: a comida só poderia ser “baixada” em lugar com esta característica.
O certo é que o caruru durante muitos anos foi esperado lá em casa. Na hora de servir, depois de feito o prato dos meninos santos, a comida tinha de ser servida a sete meninos homens, só podia ser homens, eu não entendia a discriminação, mas fazer o que? Isto era feito em um grande agdá que era colocado no centro de um pano branco estendido no chão e as crianças, que eram chamadas na rua, sentavam ali ao redor daquele prato cheio de comida e tinham de comer de mão.  Todos ficavam olhando aquilo, uma meleira da porra achando muita graça, tinha meninos que, parecendo possuídos, melavam uns aos outros, passando a comida na cara, nas roupas, enfim, era uma porcariada que divertia as pessoas.
Minha mãe sempre cantava uma cantiga relacionada aos santos meninos:
“São Cosme mandou fazer,
Uma camisinha azul,
No dia da festa dele,
São Cosme quer caruru”
Ou então:
“Cosme Damião
Oh cadê Dau
Cosme Damião onde esta o Alabá!”
Dentre outras que não me lembro
Em seguida a este ritual com os meninos, os pratos para o público começavam a sair. Antigamente não se podia negar entrada a qualquer pessoa, quem dava caruru o fazia para o povo, quem passasse na rua e quisesse entrar tinha de ser servido. Lembro-me que, quando mais velha, com uns quinze anos, cheguei a comer caruru em quatro casas diferentes no mesmo dia, não sei como não morria; gulodice só, pois ninguém agüenta uma zorra desta, mas era mesmo bom e o folclore da coisa melhor ainda.
Em dado momento lá em casa minha mãe “recebia” o santo. Era muito engraçado mesmo: ela começava a agir como se fosse uma criança muito sapeca, adorava melar os outros de mel e falava de uma maneira que a gente não entendia muito direito. Todos ficavam ao redor dela que ficava sempre esfregando as mãos uma na outra, pulava, sorria, puxava o cabelo de um, beliscava outro, dava uma risada entre dentes, dizia coisas engraçadas. As pessoas ficavam perguntando coisas, lembro-me que um dia ela virou para mim e disse que eu ia ter problemas porque eu tinha uma indaca muito grande. “indaca” segundo me informaram, não sei se realmente o significado era este mesmo, era “língua”. O engraçado é que não sou de falar da vida dos outros, mas se pensar que digo muitas coisas aos outros que alguns têm pudores de dizer, aí sim, tenho a “indaca” grande. Também soube que a minha “virgindade” seria perdida, imaginem só, perdida! O que seria feito por um homem muito mais velho que eu: pois não é que este vaticínio deu certo, a diferença foi mesmo o dobro da minha idade à época, olhe que já faz anos para danar.
Eu era um alvo danado destes meninos, sempre estavam dizendo coisas a meu respeito, algumas boas, outras más, devia ter ficado mais atenta e prestado mais atenção aos vaticínios.
convidados do ultimo caruru
Hoje já não se faz caruru na minha casa, de vez em quando, ainda peço alguma coisa aos santos meninos, eles estão ficando velhos, acho eu, porque andam meio surdos, pois peço e eles não atendem os meus pedidos, quando o fazem demoram muito, mas, mesmo assim, demorando ou não, pago as promessas; às vezes o faço antecipadamente, acho que talvez por isso, porque apesar de velhos eles continuam marotos e devem estar esperando o pós caruru.
Vatapá
Bom, eles sabem o que pedi: se acontecer, com certeza dou outro caruru, com tudo que eles tem direito, mas vou fazer um pedido público aos meninos velhos travessos. Onde o irmão “Cosme” estiver, faça-o feliz, diga-lhes que nos temos somente saudades, mas das coisas boas, e que já o perdoamos há muito. Que ele siga em paz, sem mágoas, sem revoltas, porque o queremos muito, e que ele continue  sendo o nosso super herói –“ He man” forte como um touro, mas com a inocência dos meninos marotos que inspiraram o seu nome composto como ele era: abençoado como deveria ser.
candeias
meus gêmeos
Meninos, to esperando e agradecendo pelos meninos antigos e recentes, os mais novos  Cosme Damião da nossa família:  Matheus Cosme e Pedro Damião,(alusão feita por Tininho) que sabiamente anteciparam o nascimento em cinco dias, pensando em driblar  os meninos santos, sem qualquer sucesso entretanto, porque os meninos estão atentos e acompanhando estes novos representantes do dia 27 de setembro -  dia de SÃO COSME e DAMIÃO, os santos meninos, protetores dos gêmeos e dos irmãos e de quem mais queira acreditar neles.
Ah, para a edição nova, a familia aumentou, temos mais duas meninas, Giulia e Aghata, duas  ibejés que prometem traquinagens, e que devem ser  abençoadas por vocês queridos meninos santos.
Renovo ainda o pedido de bençãos para o meu irmão, onde quer que ele esteja. 

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

O ventilador de teto


Anda na rua, hoje por necessidade, o que outrora era feito para manutenção do fisico. Já não vai mais para a orla, anda dentro do próprio condomínio onde vive, vai caminhando e sabe que os passos vão numa só direção. Não consegue ser mais forte de que esta vontade de passar pela frente da casa do “ex amor”, que mora no mesmo condomínio.
Não sabe por que vai sempre nesta direção.Já não têm mais nada; nada mesmo. Nem mesmo o “rebento” daquela relação finda  foi suficiente para que um mínimo dialogo pudesse ser mantido. Não entende muito bem a causa disto, mas é assim e pronto, o que vai fazer? Aceitar, não adianta insistir, conhece muito bem aquele que outrora foi o seu grande companheiro, o seu amor, o homem  por quem um dia esteve apaixonada e que parecia um grande e enorme “urso” desajeitado, mas, amorosamente, apaixonado.
Sim, aquele homem apaixonado era uma maravilha, até mesmo o seu grande egoismo  era esquecido em alguns momentos, mas o “desapaixonamento”  reativou, e muito, esta sua grande caracteristica.
Bom, mas ela vai andando pela calçada do outro lado da rua e olha para cima.  Sabe que ele esta em casa, o que lhe dá esta certeza é o ventilador de teto funcionanado. Ele não gosta de ar condicionado, não se sente bem, e, mesmo  podendo ter  toda uma casa climatizada, prefere o seu   ventilador de teto.
Pensa: “Que será que ele esta fazendo agora: Estará lendo o jornal?  Estará com a xícara de café na mão?  Será que já escovou os dentes? Estará fumando um cigarro?  Ou está simplesmente olhando para cima e tendo as suas grandes ideias, as suas grandes sacadas, arquitentando  acusações ou defesas, lembrando  de algum processo procurando falhas apresentadas? Que será que faz ele agora? Lembra-se do tempo em que viviam juntos em que ele acordava e  descia para a varanda para ler todos os jornais do dia, saber dos acontecimentos, dos comentários, ver se havia alguma manchete falando dele e do seu trabalho, ou de qualquer coisa que  interessasse.
De onde passa não o pode ver, salvo se ele estiver  na janela ou na varanda, ou ainda na cobertura, fora disto  nada, somente o ventilador de teto acusa a presença dele no quarto.
Um  pensamento continua martelando: como pode  não ter mesmo condição de, ao menos, falar com ele ao telefone? Não há clima, não entende, não consegue realmente perceber como um homem tão brilhante pode ter  pensamentos mesquinhos, pode se deixar levar por emoções tão bobas?
Os mundos agora são diversos, ja não pode discutir mais  com ele  quem  esta com a razão: Jung? Freud? Já não podem falar mais de Foucault, Sartre, Simone de Bouvoir e tantos outros, nem mesmo  Kierkegaard. Já não pode fazê-lo ri das suas velhas estórias de menina de interior, dos ditos populares que tanto lhe divertiam; já não lhe pode fazer mimos culinários, deixá-lo com água na boca e de água na boca. Não pode, sequer, dizer que não gosta de alguns amigos, que  tem restrições a alguns parentes, gozar a cara das  pessoas conhecidas, criticar alguns, falar do defeito de outrem. Enfim, sua vida foi desatrelada da dele, não restou nada, a não ser olhar aquele ventilador de teto, tão distante, tão indiferente, fazendo o mesmo movimento rotineiro de todos os dias, mas que é, hoje, o único elo de ligação entre o seu presente e o seu passado, entre ela e aquele homem com quem viveu um belo e grandioso amor, que foi levado pelo vento, um vento poderoso e natural, diferente daquele  que o ventilador de teto produz.
O ventilador de teto serve para refrescá-lo. Para ela, entretanto, serve para denunciar a sua presença em casa, e para confirmar que êle ainda tem um amigo fiel:  o seu ventilador de teto.


segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Transportando vida


Quase dois meses após a chegada, as malas ainda estão por desfazer. Parece que querem ficar prontas para a próxima partida, não gostam de ficar paradas, gostam do movimento  dos aeroportos, adoram ser jogadas nas bagageiras dos aviões, dos autocarros, dos trens. Se ficam ali no canto do quarto  começam a envelhecer, empoeirar-se, sentem faltam do manuseio das mãos dos carregadores, mesmo sabendo que são maltratadas, que são jogadas de um lado para outro como se não carregassem a vida de alguém, as suas lembranças, sonhos e realizações.

sábado, 17 de setembro de 2011

Dias opacos

São quatro e trinta da manhã. O dia vem surgindo lento, parece não querer sair da letargia que a noite lhe proporciona. Não quer despertar do seu sono tranquilo, ele dorme mais de oito horas, talvez, por isso mesmo, esteja ele hoje muito cansado, e, portanto  demorando mais para trazer a sua luz.

O sol não aparece. A noite trouxe a chuva e deixou as suas marcas: está escuro, nuvens  densas impedem que o dia venha com toda a sua força para esquentar o que ela esfriou.

A chuva continua a cair e a impedir que o dia acorde como deve de ser.

Tudo isto parece ratificar o seu estado de espírito; o universo parece querer lhe  mostrar o que lhe vai na alma, a dor que lhe invade o peito. Parece que os seus dias são sempre sombrios, não se aquecem. Também, como iria aquecê-los?  Para que o dia amanheça e o sol apareça e esquente a terra é necessario  que as nuvens  se afastem, que não tenha chuva, enfim que os obstáculos sejam afastados a fim de que os seus raios cheguem  esplendorosos, quentes, iluminando tudo, definindo as cores. Ela,entretanto, não consegue remover os obstáculos: os seus dias continuam sendo sombrios, mórbidos, sem luz.  Olha para os lados; paredes brancas parecem querer lhe dizer algo, algo que ela não entende, afinal paredes não falam, talvez escutem, todavia,  falar não falam.

O dia continua lutando para afastar os obstáculos, para eliminar os elementos  que  querem lhe deixar opaco; ela, ao contrário do dia, não tem forças para isto, parece ter se acostumado a viver  atrás de nuvens que lhe condicionaram a luminosidade. 

Não é feliz, bem sabe que não o é; a sua felicidade depende da felicidade de outrens. Ela jamais será feliz enquanto  outras pessoas, a quem quer bem, não o sejam. Ela bem que tenta mostrar um pouco de  brilho, para  tentar, não sabe se o faz, enganar as pessoas, a fim de que com ela não se preocupem e tentem encontrar os seus rumos, sem que a sua vida possa interferir em nada. Não quer dividir os seus problemas, as suas preocupações, as suas angústias e frustrações, sabe que se assim fizer, poderá impedir que alguém brilhe, que o sol apareça para aquela pessoa todos os dias, e ela sabe que não tem o direito de impedir isto.


Segue o seu caminho sozinha, um caminho que para muitos é de brilho, de vitórias, de conquistas e mais conquistas, mas ela sabe o quanto padece  para demonstrar um brilho que ela, seguramente, não tem, porque o universo conspirou contra si e lhe fez  assim, dissimulada, sem poder se mostrar como realmente é no seu interior.

Se para o público ela brilha e é forte, para si ela é opaca e frágil. É exigente consigo própria e,talvez, por isso mesmo, não consiga, ou pensa que não consegue, afastar os obstáculos para poder sair desta névoa que lhe consome  os dias, as noites, a sua própria existência.

Ah se eles soubessem dos seus  reais sentimentos, das suas reais intenções, dos seus medos! Não,mas eles nao podem saber, ninguém  vai penetrar neste mundo opaco interior que é o seu, ela não quer e nem tem o direito de fazer pessoas infelizes. Ela quer o brilho  para todos, quer  ver as pessoas felizes, quer que todos estejam e sejam iluminados; possivelmente tem algumas restrições em relação a alguns que ajudaram a sua vida á perder a cor, a ser sempre cinza,mas, ainda assim, quer que também estes brilhem, se recuperem.

Um dia, talvez, alguém  possa realmente notar o que lhe vai na alma, pode ser que alguém que tenha recebido muita energia e luz do sol, seja capaz de lhe retirar da neblina em que se encontra, alguém que lhe ensine que os dias  podem ser  frios,  mas eles não são motivos para fazer alguém se tornar tão opaco; alguém que possa lhe tirar desta angústia, desta solidão acentuada em que vive, preocupando-se em não demonstrar para quem ama tudo o que vai na alma, apenas e simplesmente porque os quer felizes, e por entender que não tem o direito de os fazer sofrer.

Sim, um dia quem sabe! Ela poderá realmente mostrar todo o seu brilho, não este que as pessoas pensam que ela tem, mas aquele que ela realmente terá, quando todas as as névoas forem afastadas, não só as da sua própria vida, mas da vida das pessoas a quem ama e que quer ver bem.

Retira força de si própria, remoe a  sua  própria vida para ver se consegue, ao menos, um lampejo que seja, para, como se fosse um feixe de luz entrando por uma fresta da janela da alma, lhe dizer que tudo é possivel, que ela poderá encontrar este alguém ou algo, que lhe possa ajudar a colorir os seus  cinzentos dias, e que ela possa sentir toda a quentura do sol, lhe dando vida, energia, lhe fazendo “viçosa” e feliz.

Que este dia chegue logo! O tempo está passando muito rápido e, qualquer dia, ela nem mesmo conseguirá  ver a beleza que é um dia de muito sol, o que, ainda, lhe reconforta a alma, pois, nestes dias, tem a tênue esperança de que tudo, de um momento para o outro, como num passe de mágica, possa mudar e permitir que ela se mostre sem qualquer máscara, sendo apenas ELA.




segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Uma obra em casa


Era só uma pintura dos muros do lado de fora da casa
Precisamos de:
2 latas de tinta;
40 lixas: 20 de 80 e 20de 120;
Uma lata de massa corrida;
Uma lata de massa acrílica.
- Sim doutora só isso.
- E a mão- de- obra?
O homem fica calado, faz conta mentalmente, depois de alguns minutos de dedos para lá, fala consigo próprio, movimentos de cabeça, olhares ao derredor:
- Vou botar quatro homens aqui dentro. Cada homem custa R$ 70,00 dia.
A mulher faz a conta, quatro homens a 70,00 por dia; terá de desembolsar 280,00 dia.
- Em quantos dias o senhor acaba o trabalho?
- Em quatro dias?
- Não, não meu senhor, isto tá muito caro, então vou pintar a parte exterior da casa e vou pagar R$ 1.120,00?   
 - É mesmo doutora, tá muito caro. Quanto a senhora paga?
- Não vou dar preço no seu trabalho, mas não posso concordar com este valor.
De novo o homem para, pensa, faz contas, olha mais uma vez o que terá de fazer.
- 850,00 e não se fala mais nisto.
Acerto acertado e o dia do começo dos trabalhos era o seguinte, quarta feira, com a promessa de que e em quatro dias tudo ficaria pronto.
Os trabalhadores chegam no dia seguinte: Um menino, que de tão pequeno foi apelidado de “pingo de gente”, um outro, que tinha certamente problemas chamado “Seu Jorge”, e um outro, que se achava o sabichão, de nome Ricardo. O quarto não apareceu, ao menos na quarta feira.
Os trabalhos começam e um primeiro aborrecimento: os trabalhadores são para lá de desorganizados, começam a fazer um trabalho aqui, depois mudam para acolá, esquecem o que estavam fazendo. Ela a tudo presencia, ainda calada, mas já com a vontade de “bater num deles”
A madeira do telhado é toda lixada, o pobre do “pingo de gente”, por ser menor e mais leve,  é quem fica com a pior parte do trabalho. Ele tem de subir nos andaimes e lixar toda a madeira. O trabalho é feito no primeiro dia, não sem muito aborrecimento em razão da desorganização. Se o verniz cair no chão, tem de ser imediatamente removido para não grudar. Tudo isto se  fala na teoria e todos concordam, mas o resultado pratico é uma merda,  o chão  é manchado de  verniz.
Aborrecida, ajuda na limpeza do chão, latas de solvente são gastas com a operação. Os operários não têm pena.
Enquanto  o “pingo de gente” e o “Seu Jorge”  fazem o serviço de verniz, dois bodosos e lesos; são capazes de ficar olhando para você e enquanto isto  o recipiente  vira, cai no chão, o pincel pinga, enfim, uma baboseira, o Ricardo  arma o andaime do lado de fora e começa a pintar os muros.
Na sexta feira, já se nota que o serviço não vai ser entregue  no dia combinado e, talvez por isso, e também pelo madeira do telhado da varanda ter ficado tão bonito, um novo acerto é feito, mesmo correndo o risco de  esganar um dos operários, eles são lerdos, não tem qualquer  compaixão pelo material, desorganizados, sujos  e mal educados.
Um novo acerto é feito, a casa merecia um tratamento rejuvenescedor total. Seria toda pintada, inclusive com a escada raspada e envernizada, tudo no valor total de R$ 1.500,00.  Lisa de material: Duas latas de tinta, massa acrílica, mais lixas, muito mais lixas mesmo. Uma profusão delas.
Vai comprar o material, queria uma tinta linda, brilhosa, que deixasse a casa  luminosa. 
- Quero tinta para interior.
Foi fazer a compra com o irmão, um sujeito que tem a mão muito segura: - Você vai comprar esta por que? Esta daqui faz o mesmo efeito, e é uma tinta muito boa.
- Não  rapaz, quero uma tinta boa mesmo.
Compra as tintas recomendadas pelo irmão, mas sabe que vai utilizá-la do lado de fora, porque dentro ela vai usar a que quer mesmo, 250,00 a lata.
 Leva o material pedido.
- Doutora, a tinta está errada, eu pedi branco neve e esta é branco gelo.
- Puta que pariu, que droga, e agora? Você já abriu a lata, não vai poder trocar.
Procura a nota fiscal e pede a cunhada para ir até a loja, chega lá e explica o que aconteceu, claro que houve um começo de stress, porque a “mocinha”   diz que  não ia trocar sem a nota fiscal.
Um rapaz que esta dentro do balcão diz que isto não é problema porque a nota fiscal fica arquivada na memória do computador, pede o nome  do comprador e  verifica a nota, onde esta descriminada a compra efetivada: lixas 120, lixas 80, massa corrida, verniz, e duas latas de tinta  branco neve... Erro da loja que fez a entrega errada, erro do comprador que não observou no momento em que a tinta foi colocada carro: uma era areia e a outra  bege, nenhuma delas branca, seja neve ou gelo. Eles trocam uma das latas, a outra, que foi aberta também seria trocada, mas o  “mestre”  se antecipou e fez a troca, não se sabe como. Aproveita que foi com a cunhada e compra a tinta de R$250,00a lata, para pintar o interior, no que realmente acertou, porque a sala ficou mesmo muito bonita, ganhou uma luminosidade sensacional.
Tudo comprado, volta  para casa. Material pedido todo entregue, a obra continua.
Os quartos estão precisando de retoque  de uma nata de cimento, a parede rachou:  fazem uma massa leve e  aplicam-na, sujam os quartos todo.  Ela, atenta, manda limpar. A  limpeza não fica boa, ela espera que o serviço ali acabe e, à noite, sozinha,  limpa tudo, passa não sei quantas vezes o pano, e agradece ter trazido de Portugal aquela ferramenta que todas as casas devia, ter: o esfregão de micro fibra. Os quartos dormem mais ou menos arrumados.
Dia seguinte, processo de lixagem  dos lugares retocados. Uma poeirada danada. Depois uma camada de massa corrida. Secada a massa, nova lixada, sujeira pura, a casa fica coberta de poeira branca, ela tosse, o nariz  coça, a boca esta seca. 
Para que diabo inventou isto? Sabe que é necessário, mas já esta mesmo muito estressada. Não gosta de gente, quanto pior desconhecidos, porcos, que falam alto.
Bom, mas já tinha começado e ali não podia mais parar, no ponto em que as coisas estavam só indo pra frente, não ha mais como retroceder.
Tem de ir até a rua, e quando volta os “pseudo pintores” já fizeram estrago: derramaram verniz no chão de cerâmica ocre; não cobriram o chão e há muitas marcas de tinta branca na sala. Olha desesperada para aquilo,  manda que limpem imediatamente. Eles pedem mais panos. Ela já pegou todos os panos disponíveis, mas não o suficiente para os pintores, que simplesmente, deixam os panos ficarem grudados, sujos, resultando que no dia seguinte não servem para nada.
- Onde esta o solvente? Tem de jogar aqui onde o verniz caiu.
- Acabou.
-Acabou? Vocês estão bebendo solvente, já lá se foram duas latas.
- Acabou sim.
Sai e vai comprar outra lata de solvente, traz a lata e manda que limpem o chão onde o verniz caiu.  Serviço que foi feito, embora muito mal feito, o chão fica grudando, e ela tem de terminar o serviço lavando o local com sabão.
Está chegando no seu limite.  Armam o andaime  na parte de cima, quem continua responsável pela raspagem das madeiras e o envernizamento dela é o “pingo de gente” que  descendo as escadas da casa, com uma escada de metal numa mão, e o recipiente de verniz na outra, deixa este ultimo cair: mais prejuízo, mas sujeira, mais grudação, mais aborrecimento, mais raiva, mais esforço físico para limpar tudo.  A parede branca em baixo da escada está toda respingada de verniz, resultado: trabalho na hora de raspar para aplicar a tinta branca.
O dia acaba, o serviço não anda, parece estar estacionado.
Ricardo acaba a sala, que se mais bem pintada teria ficado muito mais linda.
Necessita-se de um eletricista para  mudar as lâmpadas da cozinha: Aparece um tal de “grilo”. O grilo é um senhor que pensa ser um galã, é limpo, baixinho, tem um bigodinho branco que demonstra o seu passar pelos anos. Chega cheio de moral, dá a lista de material. Saem os dois; ela e o “grilo” para efetivar a compra. Ele vai de bicicleta, ela vai a pé: compram tudo,  e a surpresa:  A senhora leva o material porque eu vou ter de ir ali, daqui a pouco volto.
Ela ri, então ela ia aguentar levar aquilo tudo, mas, para sua surpresa, tudo é leve.  Leva tudo para casa e começa a esperar o Sr. Grilo, com o andaime armado na cozinha. O desgraçado não aparece, e, o andaime tem de ser retirado.
O eletricista só volta no dia seguinte, e quando chega quer o andaime seja rearmado na cozinha. Ela diz que não vai mandar desarmar o andaime, que já estava do lado de fora, que agora ele vai fazer o serviço com uma escada. O homem não gosta da idéia, mas tem de admitir que ele foi errado, se tivesse voltado no dia anterior, como prometera, tudo já estava pronto.
O serviço é feito, e depois de longos doze meses, a cozinha volta a se iluminar. O serviço do  “grilo” termina, foi tudo rápido, e ele recebe, por apenas  uma ou uma hora e meia de trabalho, R$ 50,00, imagine se isto vira moda, um trabalhador não especializado, apenas um curioso, ganhando por hora quase 50 reais, o que equivaleria a  12.000,00 de salário mensal. Ela pensa: acho que vou me especializar em alguma coisa técnica e lembra do seu salário.
 No dia seguinte aparece um outro “pintor”. É cheio de bossa, de moral, todo tirado. O nome é Alex, tem olhos azuis.  Ela não gosta da aparência do homem, quanto pior por ser ele do lugarejo onde vive, melhor seria alguém de outro lugar.
O homem, no primeiro dia, faz o serviço do quarto quieto, calado, mas no dia seguinte já esta cheio de intimidades, tão cheio que a mulher vem bater na porta da casa para procurá-lo. Ela se aborrece, então alguém que não conhece vem bater na sua porta para procurar um desconhecido, que só estava ali por força de um trabalho. Chama o mestre de obra, e  queixa-se, diz que não quer mais o cara ali na casa. Mais stress, mais aborrecimentos. Este também é muito bodoso, e não limpa o que suja, segundo os outros, ele diz que este trabalho não é para ele, que só faz pintar.
O dia acaba, ela já esta mais de que arrependida de ter começado a obra, mas não dá para parar no estagio em que a pintura está.
São os mesmos profissionais que aparecem no dia seguinte, portanto, mais sujeira, mais confusão, mais aborrecimentos. Livrou-se apenas de um, o Sr. Jorge,  este não vai melar mais nada, mas ainda tem os outros dois, o Alex e o  pingo de gente, r raspada.
Dá uma bronca em todo mundo, mas eles são cínicos, parecem não ligar, porque, ato contínuo, mais sujeira, mais derrame de material.
O homem dá uma parede por pintada, ela reclama, diz que não está boa, o mestre manda o cara pintar de novo, e ela ouve ele dizer “De novo”!
- Sim, de novo, você não fez o correto, a parede tá toda manchada.
O homem recomeça o trabalho zangado, ela também esta p. da vida.
Chega o sábado, dia em que tudo deveria estar terminado, mas isto não acontece, e o pessoal trabalha somente até o meio-dia, estão apressados porque querem receber o dinheiro da semana trabalhada.
A varanda de frente não esta acabada, e assim vai ficar até o final de semana, tem de esperar pela boa vontade do pessoal.
O que fazer?  Temos de esperar a segunda feira, pois acreditem, os homens não aparecem para trabalhar, nem segunda e nem terça e tudo fica como está, a única coisa que não fica como está é a raiva da dona da obra que, se pudesse, com certeza  colocava todos para fora, e se fosse ela dona de uma empresa, seria uma despedida coletiva por justa causa.
Um conselho: quando tiver de fazer uma pintura na casa, saia dela, contrate uma empresa e só volte quando a tudo estiver pronto, ainda que seja mais caro. 

sábado, 3 de setembro de 2011

Mais um anônimo (a)

Parece que estou me especializando em incomodar anônimos! Sim porque recebi “ameaças” de um anônimo, ou anônima, não sei, porque, como anônimo que é, não podemos identificar o sexo.

Não publiquei o comentário, exatamente, porque não assinado, não identificado, não conhecido, além do palavreado não ser condizente com os leitores do blog.

É evidente que um escritor tem leitores e que estes são anônimos, teria muita graça que um autor conhecesse todos os que o lêem, mas há uma grande diferença entre o leitor anônimo, e o anonimato de alguém que se diz identificado pelo autor, mas não tem a coragem de sair do seu próprio anonimato.

Diz o anônimo (a) que vai me processar porque estou expondo a vida dos outros, que eu não tenho direito de fazê-lo. Mas como posso saber quem vai me processar? De quem falei?A quem pertence à estória?

O escritor cria, se os fatos narrados têm correspondência com a vida de alguém é uma mera coincidência; aliás, a partir de agora, e isto agradeço ao anônimo (a), vou colocar no final do post esta advertência: “qualquer semelhança é mera coincidência”, para evitar que anônimos tomem para si o que ali se contem e se julguem ofendidos, como se fosse possível alguém ofender anônimos.

 O engraçado disto tudo é que o anônimo (a) que se diz identificado, que se diz ofendido, que ameaça um processo e que termina por ofender, literalmente, a escritora, é que esta se identificando para os leitores, embora o escritor não o (a) conheça, ainda que se identificasse mesmo, que tivesse a coragem de fazê-lo, continuaria desconhecido, porque fora da realidade de sua vida.

Se alguém identificou-se com o que estava descrito no texto, certamente deve ter passado por uma situação similar, talvez por isso a revolta, a agressividade, as baixas palavras. O escritor não se importa, não vai valorizar anônimos, eles não têm coragem, são covardes, e no mundo da ficção (muitas vezes tão real que é confundido com a vida de cada um) só há lugar para covardes, exatamente, na própria ficção, aliás, neste gênero literário há uma grande quantidade de heróis, mas há uma enorme quantidade de “bandidos”; eles são sempre mais numerosos, porque desejam o mal, e o mal é bem mais fácil de ser executado.

Todavia, como o anônimo (a) esta fazendo uma ameaça, que não será publicada no post para preservação dos outros leitores, há que se ter em mente, se a ameaça for cumprida, que o texto não cita qualquer nome e, portanto, ainda que possa qualquer pessoa com ele identificar-se, não existe possibilidade de ser cumprida a tal ameaça. Bom, mas anônimo não deve saber disto, não deve ter sido preparado (a) para entender e comportar-se diante deste entendimento.  Todavia, não cabe ao escritor ameaçado fazer ponderações aqui, se a ameaça do anônimo (a) for cumprida, quando ele for conhecido, porque terá de identificar-se, uma vez que numa relação há que se ter duas partes completamente identificadas, além da exigência da existência de provas suficientes para que o julgador possa, realmente, estabelecer o nexo necessário ao reconhecimento de uma exposição particular da vida de alguém, aí sim, os argumentos serão utilizados com a lógica necessária. 

Quando isto acontecer, tanto o escritor como os seus demais leitores, saberão de quem se trata e ele “spont sua” estará expondo a sua própria história sem a interferência de quem quer que seja.

Bom, mas já perdi tempo demais falando do nada, porque um ser que se diz estar neste mundo, neste dos que “são e estão”, não pode esconder-se atrás do anonimato. Se usa este artifício para ameaçar, ofender, mostrar a que veio e o que realmente é, é porque, na realidade, é um “nada”, e, como nada que é, deve recolher-se à sua própria insignificância, desassociando-se da importância que pensa ter, que o (a) leva a pensar poder ser o personagem de uma estória (ficcional) escrita para alertar pessoas que tem comportamentos parecidos, para que tenham cuidado; a vida pode nos pregar peças, algumas cômicas, outras dramáticas, mas que deixam marcas que podem tatuar as almas, deixando cicatrizes mal curadas que “condicionam”, para sempre, todo um ser.

Cuidado anônimo (a), você pode ter estas cicatrizes, procure se tratar com urgência, para que as suas tatuagens não sejam divididas com os outros, que não têm culpa das suas angústias, frustrações, dramas, recalques.

Quando tiver tempo, já que é um leitor(a) do blog, leia “anônimo” vai te fazer bem e você poderá encontrar-se no “nihil” que é ser “anônimo”.

Um belo dia de sol

Acordou. A cachorra de nome interessante, afinal é muito “chic” ter uma animal de raça, está ao seu lado. Contrariamente ao chique da cadela, ela dorme no chão da sala, não que não tenha quartos decentes onde está, mas porque a sala é mais fresca e, além de tudo, por estar sozinha naquela imensa casa feita para abrigar muitos e com amor,dorme sozinha e ali para perceber os ruídos não habituais da noite.
O fato é que a “golden retriever”, presença que lhe foi imposta por outros menos “impostos”, está ali ao seu lado aflita para sair para fazer as suas necessidades. Ela, a cachorra, é mais educada de que algumas pessoas que conhece.
Levanta, abre a porta, já tinha visto pelos vidros canelados das janelas sala que o dia está lindo, apesar de que, se não estivesse, não faria qualquer diferença, porquanto os seus últimos dias têm sido sombrios e feios, porque quando se não está bem na alma, nem mesmo um brilhante dia faz qualquer diferença.
O certo, entretanto, é que se surpreendeu mesmo, o dia está radiante; não há nuvens no céu que está de um azul límpido. O sol brilha em todos os lados, não ha sequer sombras, a não ser a da sua casa sobre a relva verde que cresce e se mostra fresca no jardim. As onze horas ainda não acordaram, esperam o seu horário, mas os vasos  foram pintados, gentilmente, pelo pintor que, delicadamente, depois de pintar tantos grandes espaços, resolveu colorir os caqueiros.
A cadela procura o seu sanitário na grama, tem quase que um lugar especifico para as suas necessidades. 
A “golden retriever” que agora já não pode ser pedante, está deitada do seu lado direito, ela é mesmo linda, mas anda triste; como ela, sente saudades dos “seus”.
Pelo reflexo da tela do note book vê os seus cabelos que o sol dá reflexos dourados. Percebe-se ali, vê que não é mesmo mais nenhuma menina. As marcas do tempo se exteriorizam a cada dia com mais vibração, com mais fortaleza e são fortalecidas pelo que lhe vai ao interior, mas a casa está linda.  Ela gosta do que vê, apesar dos zeros da direita da conta bancária terem aumentado sensivelmente, acha que valeu a pena. Tá tudo limpo, como ela gosta. Limpo e lindo ao mesmo tempo.
Os cavalos marinhos pendurados na parede brilham, foram lavados e vaselinizados. A palmeira esta afastada do muro, porque o chão foi lavado. A obra da casa vizinha sujou tudo de cimento, e o vaso foi retirado do seu lugar habitual.
O peixe de acrílico continua no seu lugar vai ser lavado, mais uma vez; hoje ainda tá cheio de poeira da obra.  O sol esquenta. Os pássaros cantam, a pitangueira é um chamariz e eles vêm abortar as flores que não se transformaram em pitangas que, tanto a dona da casa, como eles gostam.  Alguma coisa acontece com a goiabeira, mas alguém já garantiu que ela se recupera.
As borboletas, do outro lado da parede, armam seu vôo sem bater as asas; são lindas! Ninguém acredita que são feitas de conchas do mar.
Realmente a casa brilha. O sol esquenta o ombro dolorido, mas a vontade de descrever o belo é maior de que a dor provocada pelo movimento da digitação do texto.
Bêbados, acreditem, passam pela porta. As vozes denunciam o estado etílico. São apenas 5:45 horas da amanhã. Um deles fala espanhol, normal neste lugar.
Um momento de extrema paz, tudo calmo, o dia ainda não começou em sua efervescência. Ainda não há som de “arrocha” nas casas e nem nos carros, é tão cedo que nem o carro de lixo passou.
Um bem-te-vi, (será que se escreve assim) enorme, com o seu papo amarelo dá um vôo rasante na varanda. Daqui a pouco ele vai voltar para comer a comida da cara, aliás, acabou de fazê-lo: A comida é de cachorro, mas agrada a pássaros, principalmente os maiores.
A mesa coberta com um “pano” africano harmoniza-se com o ambiente. A claridade do sol faz refletir o dourado que forma a sua diversidade.
O dia vai acordando, o caminhão do lixo vai passando levando a sujeira, não toda, porque ele só limpa o exterior, a sujeira interior tem de ser levada de outra maneira, talvez o sol possa fazer isto, queimando com os seus raios fortes, com a sua quentura, tanta coisa ruim que passa no interior de cada um.As mudas de manjericão, de coentros, alface, couve, hortelã sobreviveram à poeira e a falta de água, o caseiro preguiçoso deixa de molhar, mas elas parecem ser fortes e resistem. Hoje serão relocadas. A hortelã e o manjericão (basilico) trarão  Portugal até a casa, as sementes foram compradas lá.
Realmente, o dia está lindo, vai permanecer assim. Levanta-se. Vai curtir a sua casa, é a única coisa que lhe resta curtir mesmo. Fica satisfeita com os resultados da iniciativa de reavivar as cores. As portas brilham com o novo verniz. O branco das paredes ganhou mais luminosidade, a tinta foi especial, e, por isso mesmo, bem cara, mas o resultado é “esplendoroso”. A escada, envernizada, fica maravilhosa, embora a sua utilidade já não é mesmo tão necessária, afinal, o quarto de cima, o que seria sinônimo de aconchego, de cumplicidade, de “amor” perdeu a sua finalidade, mas, de qualquer maneira, tudo foi refeito, repintado, coisas retiradas e jogadas fora, como se isto fosse suficiente para apagar um passado, que hoje, com este dia maravilhoso, deveria voltar só um pouco, para harmonizar-se com o que o sol e o céu azul já começaram a fazer.
É tudo isto seria perfeito se tudo estivesse no lugar. Filho feliz, ela feliz, família feliz. Tem fé, esperança. Quem sabe um dia o criador lembre que, nem sol e nem céu, nem uma bela casa, são suficientes para amenizar almas, é preciso mais, muito mais, inclusive, e o mais importante: AMOR.